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É PRECISO CONHECER A REALIDADE!




A Água (que ninguém vê) na guerra

Ana Echevengua¡

“Para além das manchetes do conflito do Oriente Médio, há uma batalha pelo controle dos limitados recursos hí­dricos na região. Embora a disputa entre Israel e seus vizinhos se concentre no modelo terra por paz, ''há uma realidade histórica de guerras pela Água'' - tensões sobre as fontes do Rio Jordão, localizadas nas Colinas de Golã, precederam a Guerra dos Seis Dias . Raymond Dwek - The Guardian, [24/NOV/2002] *

A nossa sobrevivênncia na Terra está ameaçada. Sem alimento, o ser humano resiste até 40 dias; sem Água, morre em 3 dias. Somos Água! Mas, enquanto a população se multiplica e a poluição recrudesce, as fontes de Água desaparecem.

Na guerra do momento “Israel em Gaza -, por que a mídia sensacionalista não fala sobre a Água - um dos itens mais importantes dos conflitos no Oriente Médio?
Oriente Médio... uma região aonde Água vale mais do que petróleo... E sempre nos passam a ideia de que lá as guerras ocorrem pela conquista das reservas de petróleo.

E a conquista das reservas de Água? Em 1997, o então vice-diretor geral da UNESCO, Adnan Badran, no seminário “As águas transfronteiriças: fonte de paz e guerra (que centrou os debates nas Águas do Mar Aral, do rio Jordão, do Nilo...) disse que A água substituirá o petróleo como principal fonte de conflitos no mundo.

Embora Israel tenha sérios problemas com recursos hí­dricos, detém o controle dos suprimentos de Água, tanto seus como da Palestina.

Além de restringir o uso da Água, luta pela expansão do seu território para obter mais acesso e controle deste recurso natural. Ali, nele estão:

- Águas superficiais: bacia do rio Jordão (incluindo o alto Jordão e seus tributários), o mar da Galileia, o rio Yarmuk e o baixo Jordão;

- Águas subterrâneas: 2 grandes sistemas de Aquíferos: o aquifero da Montanha (totalmente sob o solo da Cisjordânia, com uma pequena porção sob o Estado de Israel), Aquífero de Basin e o Aquífero Costeiro que se estende por quase toda faixa litorânea israelense até Gaza.

Tais Águas são as transfronteiriças, são recursos naturais compartilhados. Segundo recente inventário da UNESCO, 96% das reservas de Água doce mundiais estão em aquí­feros subterrâneos, compartilhados por pelo menos dois paí­ses.

Há regras internacionais para o uso dessas Águas. Algumas destas obrigam Israel a fornecer Água potável aos palestinos.

Mas Israel não compartilha a Água; afinal, tais regras internacionais não prevêem mecanismos de coação ou coerção; é letra morta. O Tribunal Internacional de Justiça, até hoje, condenou apenas um caso relacionado com águas internacionais.

A estratégia de Israel é outra. Em 1990, o jornal Jerusalém Post publicou que “é difícil conceber qualquer solução política consistente com a sobrevivência de Israel que não envolva o completo e contí­nuo controle israelense da Água e do sistema de esgotos, e da infra-estrutura associada, incluindo a distribuição, a rede de estradas, essencial para sua operação, manutenção e acessibilidade”**. Palavras do ministro da agricultura israelense sobre a necessidade de Israel controlar o uso dos recursos hí­dricos da Cisjordânia através da ocupação daquele território.

O Acordo de Paz de Oslo de 1993, por exemplo, estipulou que os palestinos deveriam ter mais controle e acesso a Água da região.

Nessa época, segundo o professor da Hebrew University, Haim Gvirtzman, dos 600 milhões de metros cúbicos de água retirados anualmente de fontes na Judéia e Samaria, os israelenses usavam quase 500 milhões, satisfazendo cerca de um terço de suas necessidades hí­dricas. Para ele, isso gerou um direito adquirido sobre a Água. Questionado sobre o acesso palestino a Água, o professor respondeu que “Israel deve somente se preocupar com um padrão mínimo de vida palestino, nada mais, o que significa suprimento de Água para eles são para as necessidades urbanas. Isso chega a cerca de cinquenta a cem milhões de metros cúbicos por ano. Israel não é capaz de suportar essa perda. Portanto, não deveríamos permitir que os palestinos desenvolvessem qualquer atividade agrí­cola, porque tal desenvolvimento virá em prejuízo de Israel. Certamente, nunca permitiremos aos palestinos suprir as necessidades hídricas da Faixa de Gaza por meio do Aquífero montanhoso. Se purificar a água do mar não é uma solução realista, então deixemos que o façam para as necessidades dos residentes da Faixa de Gaza**.

E na Guerra pela Água vale tudo: os israelenses bombardeiam tanques d'água, grandes ou pequenos (muitas vezes construí­dos nos telhados de suas casas), confiscam as bombas d’água, destroem poços, proí­bem que explorem novos poços e novas fontes d’água (a Cisjordânia, em 2003, contava com cerca de 250 fontes ilegais e a Faixa de Gaza, com mais de 2 mil). Israel irriga 50% das terras cultivadas, mas a agricultura na Palestina exige prévia autorização.

Então, furto de Água das adutoras de Israel é comum naquela região.

A regra do jogo é esta: enquanto o palestino não tem acesso Água para beber, o israelense acostumou-se ao seu uso irrestrito.

Sendo assim, dá pra imaginar uma outra forma de divisão ou de uso compartilhado desses recursos hí­dricos para os próximos anos? Dá pra imaginar a sobrevivência de qualquer estado e, nesse caso, da Palestina sem o controle efetivo do acesso e da distribuição dos recursos hídricos que necessita?

Botar a mão na Água é coisa antiga. Britânicos e franceses no Oriente Médio definiram as fronteiras (em especial da Palestina) de olho nas Águas da bacia do rio Jordão.

Desde 1948, Israel prioriza projetos, inclusive bélicos, para garantir o controle de Água na região. Dentre estes:

- a construção do Aqueduto Nacional (National Water Carrier);

- em 1967, anexou os territórios palestinos de Gaza e Cisjordânia e tomou da Sí­ria as Colinas do Golã, ricos em fontes de Água, para controlar os afluentes do Rio Jordão. Sobre esta guerra, Ariel Sharon falou que a idéia surgiu em 1964, quando Israel decidiu controlar o suprimento da Água;

- em 2002, a construção de um muro de segurança viabilizou o controle israelense da quase totalidade do Aquífero de Basin, um dos três maiores da Cisjordânia, que fornece 362 milhões de metros cúbicos de Água por ano. Segundo Noam Chomsky, "O Muro já abarcou algumas das terras mais férteis do lado oriental. E, o que é crucial, estende o controle de Israel sobre recursos hí­drico críticos, dos quais Israel e seus assentados podem apropriar-se como bem entenderem..."***. Antes do muro, ele já fornecia metade da Água para os assentamentos israelenses. Com a destruição de 996 quilômetros de tubulação de Água, a população palestina do entorno do muro falta água para beber;

- antes de devolver (simbolicamente) a Faixa de Gaza, Israel destruiu os recursos hídricos da região. E, até hoje, não há infraestrutura hí­drica nas regiões palestinas.

Quantos falam a respeito disso??? Em 2003, na 3ª Conferência Mundial sobre Água, em Kyoto, Mikhail Gorbachev bateu na tecla dos conflitos mundiais pela Água: contabilizou, na época, 21 conflitos armados com o objetivo de apropriação de mais fontes de água; destes, 18 ocorreram em Israel.
Gestão conjunta, consumo igualitário de Água, ética e consenso na Água são “palavras bonitas no papel, nas mesas de negociação, na mas ­no dia a dia... Na prática, é utopia”.

O que a ONU e os donos do planeta estão esperando para exigir que Israel cumpra as regras internacionais sobre Águas mesmo que estas contidas em convenções, acordos, declarações (e outras abobrinhas)...

Quem vai ter coragem de criar regras claras e objetivas para punir a violação dos direitos dos povos e também a sua soberania sobre seus recursos e riquezas naturais?

Ana Echevenguá ana@ecoeacao.com.br por googlegroups.com


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