Tema:
LEI MARIA DA PENHA
- Lei nº 11.340/06: Lei Maria da Penha ou Lei
de violência doméstica e familiar contra a mulher.
1 –
Antecedentes históricos
- Até
1990, a questão da violência era
tratada pelas seguintes normas:
a) Em
1990 foi editada a Lei nº 8.069/90 (o ECA), com a finalidade de combater a violência contra a criança e o adolescente.
b) Em
1990 foi editada a Lei nº 8.072 (lei dos crimes hediondos), com a finalidade de
combater a certas violências, consideradas também especiais (extermínio,
estupro, genocídio, etc.).
c) Em
1990 foi editada a Lei nº 8.078/90 (CDC), com a finalidade de combater a
violência contra o consumidor, um personagem também especial.
d) Em
1995 foi editada a Lei nº 9.099/95 (Leis dos Juizados Cíveis e Criminais) – criada
para dar tratamento especial à violência
de menor potencial ofensivo, que à época, abrangia a violência doméstica e familiar. E assim, entendem os doutrinadores,
que a violência doméstica foi banalizada
como de menor potencial ofensivo.
e) Em
1997 foi editada a Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), com a
finalidade de combater a violência no
trânsito.
f) Em
1998 foi editada a Lei 9.605/98 (Crimes Ambientais), com a finalidade de
combater a violência contra o meio ambiente.
g) Em
de 1º de outubro de 2003, foi
editada a Lei nº 10.741 (Estatuto do Idoso), com a finalidade de combater qualquer
tipo de violência contra os idosos (discriminação, violência física ou moral,
ato de crueldade e opressão e maus tratos).
h) Em
2006 foi editada a Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha), com a finalidade de
combater a violência doméstica e
familiar contra a mulher.
2 – A
multidisciplinariedade da Lei Maria da Penha
- A
Lei Maria da Penha não é uma lei penal, ou seja, trata-se de uma lei multidisciplinar, vez que, em seu texto se verificam normas de
cunho penal, processual penal, civil, processual civil, trabalhista e
previdenciário.
- Os
dispositivos penais e processuais penais na Lei Maria da Penha são minorias,
cerca de 10%.
3 –
As finalidades da Lei Maria da Penha
- O art.
1º, da Lei Maria da Penha é por demais claro,
quando esclarece que a finalidade da
referida legislação não é punir (finalidade extrapenal), senão vejamos:
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 1º - Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição
Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra
a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela
República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e
proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. (...)”
- A hermenêutica do art. 1º, da Lei Maria
da Penha, revela as seguintes finalidades:
1ª Finalidade = Prevenir/coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
2ª Finalidade = Assistir a mulher
vítima de violência doméstica e familiar.
3ª Finalidade = Proteger a mulher vítima de violência doméstica e familiar.
4ª Finalidade = Criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a mulher.
- Atenção: A Lei Maria da Penha reconhece
que o homem pode ser vítima, em face do disposto no art. 129, § 9º, do Código
Penal:
“Código Penal
(...)
Art.129 – Omissis.
(...)
§ 9º Se a
lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou
companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se
o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Acrescentado pela Lei nº 10.886/2004) (Alterado pela Lei nº 11.340/2006) (...)”
-
Considerando que a modificação
(alteração legislativa) no teor do § 9º, do art.
129, do Código Penal, foi provocada por meio da edição da Lei Maria da Penha
(Lei nº 11.340/06), disciplinando a lesão praticada contra ascendente,
descendente, irmão (homem ou mulher), cônjuge e companheiro (homem ou mulher), está claro que a Lei Maria da Penha
reconhece que o homem pode ser vítima.
- Atenção: Juridicamente, o fato do reconhecimento de que o homem pode ser
VÍTIMA de violência doméstica, não o torna objeto de proteção (tutela) da
Lei Maria da Penha, ou seja, a Lei Maria
da Penha só protege a mulher.
- Atenção: Juridicamente, se o homem for vítima de violência
doméstica ele terá a tutela do Código Penal, mas, se for mulher a vítima de
tal espécie de violência, ela terá o Código Penal (para punir) + Lei Maria da
Penha (para assistência e proteção).
4 –
Sobre a constitucionalidade da Lei Maria da Penha
- A questão
da inconstitucionalidade da Lei Maria da Penha está relacionada à superproteção que foi deferida à
mulher, porém, essa superproteção não
foi estendida ao homem, o que, segundo alguns juristas, seria uma ofensa ao Princípio da Isonomia.
-
Sobre a inconstitucionalidade da Lei
Maria da Penha existem duas
correntes:
I) A primeira corrente defende a INCONSTITUCIONALIDADE
(corrente minoritária), ou seja, trata-se de uma tese que advoga a existência de ofensa ao art. 226, § § 5º e 8º, da Constituição Federal de
1988, consoante se verifica abaixo:
“Constituição Federal
(...)
Art.226 – Omissis.
(...)
§ 5º - Os direitos e deveres
referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela
mulher.
(...)
§ 8º - O Estado
assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram,
criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.(...)”
- A
hermenêutica do § 5º, do art.226, da CF/88 trata do princípio da isonomia
familiar, logo, uma lei
infraconstitucional (Lei Maria da Penha) se ofender tal princípio se torna
inconstitucional. No caso da Lei Maria da Penha, a mesma concede mais direitos para a mulher do que para o
homem, logo, estaria ocorrendo um desrespeito ao referido princípio, pois, direitos entre homem e mulher tem que ser
exercidos igualmente.
- A
hermenêutica do § 8º, do art.226, da CF/88 disciplina a proteção para todos os membros da família (incluindo o homem),
logo, a mulher não é a única destinatária dessa proteção. E mais uma vez, a Lei Maria da Penha ficou aquém do
mandamento constitucional, quando se
destinou a garantir assistência, apenas, para a mulher.
- A corrente da inconstitucionalidade pode
ser demonstrada nos seguintes exemplos:
I) Antonio e Maria são pais de Bethania,
de 17 anos. Maria aplicou umas bofetadas no rosto de Bethania. Neste caso se aplica a Lei Maria da Penha.
II) Antonio e Maria são pais de Carlos,
de 17 anos. Maria aplicou umas bofetadas no rosto de Carlos. Neste caso não se aplica a Lei Maria
da Penha.
III) Carlos bateu em sua irmã, Bethania. Neste caso se aplica a Lei Maria da
Penha.
IV) Bethania bateu em seu irmão, Carlos. Neste caso não se aplica a Lei Maria
da Penha.
II) A segunda corrente, que defende a
CONSTITUCIONALIDADE (corrente majoritária), tem fundamento na
ideia da desigualdade de fato entre
Homem e Mulher, razão pela qual existem os Sistemas
de Proteção, que são os seguintes:
a) Sistema de Proteção Geral – não tem
destinatário certo. Ex.: Código Penal
b) Sistema de Proteção Especial – tem destinatário
certo. Ex.: Lei Maria da Penha
- Atenção: Segundo o Direito
Constitucional, a Lei Maria da Penha se configura em uma ação afirmativa.
- Atenção: Rogério Sanches Cunha defende
que é possível o Juiz estender aos
homens vítimas as medidas protetivas, usando o poder geral de cautela
(art. 798, do CPC).
5 – A Lei Maria da Penha e o Transexual
- Atenção: O transexual não se confunde
com o homossexual. Transexual não se confunde com bissexual e nem com travesti.
Transexual não é transformista, não é hermafrodita. Transexual é aquele que apresenta uma dicotomia física e psíquica,
ou seja, fisicamente, é de um sexo e
psicologicamente é de outro.
- Atenção: Segundo Cristiano Chaves e
Nelson Rosenwald[1], se o transexual fizer a cirurgia ele tem
direito de registrar o novo sexo, alterando, inclusive o seu nome.
- O STJ decidiu que o transexual, quando
definitivamente operado, que alterou o registro, inclusive com mudança de nome,
é mulher e é protegido pela Lei Maria da Penha.
6 – Violência doméstica e familiar
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art.
5º - Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra
a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero (violência preconceito/discriminação) que lhe cause morte,
lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
(...)”
-
Segundo a hermenêutica do art. 5º, da Lei nº 11.340/06, o objeto de tutela da mesma é a violência
preconceito ou a violência discriminação, logo, o Estado-Juiz só pode
aplicar a referida lei quando for pratica uma violência preconceito ou violência
discriminação.
- Atenção: O Juiz só pode aplicar a Lei
Maria da Penha se a mulher estiver
em situação de hipossuficiência. Do
contrário, não aplica a Lei Maria da Penha.
- Atenção: A violência de gênero é uma violência preconceito contra alguém
(alguém gênero). Gênero é a violência
preconceito em razão de idade ou de sexo. São exemplos de violência de
gênero:
a) A violência contra criança e
adolescente (preconceito em razão da idade);
b) A violência contra o idoso (é uma
violência de gênero, vez que o preconceito ocorre em razão da idade);
c) A violência contra a mulher (pode ser
de gênero se houver preconceito e discriminação contra o sexo).
- Atenção: O STJ entende que a Lei Maria
da Penha não se aplica quando o motivo da agressão é ciúme, vez que, ciúme não é
preconceito, não é discriminação, logo, permite a aplicação da Lei nº9.099/95.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art.
5º - Omissis.
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente
de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente
agregadas; (...)” (grifo nosso)
- A unidade doméstica é o ambiente caseiro,
sem considerar o vinculo de parentesco ou vínculo familiar entre os envolvidos.
-
Segundo a hermenêutica do inciso I, do art.5º, da Lei nº 11.340/06, a agressão deve acontecer no
ambiente caseiro, não interessando o vínculo familiar.
- Atenção: Rogério Sanches Cunha defende
que se a violência for praticada contra
empregada doméstica no ambiente caseiro, também será aplicada a Lei Maria da Penha.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art.
5º - Omissis.
(...)
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por
afinidade ou por vontade expressa;(...)” (grifo nosso)
- Segundo
a hermenêutica do inciso II, do art.5º, da Lei nº 11.340/06, deve ser
aplicada a Lei Maria da Penha, quando a violência acontece no âmbito da família.
Explicando melhor, não há necessidade de
coabitação, mas, exige-se o vínculo
familiar, ainda que seja vínculo por afinidade.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art.
5º - Omissis.
(...)
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.(...)” (grifo nosso)
-
Segundo a hermenêutica do inciso III, do art.5º, da Lei nº 11.340/06, em qualquer relação íntima de afeto será aplicada a Lei Maria da
Penha, logo, estão abrangidos:
a) namorados e ex-namorados, desde que a
agressão tenha ocorrido em razão da convivência comum.
b) Ex-marido e ex-mulher, amantes.
- Atenção: O STJ entende que a Lei Maria
da Penha se aplica quando praticada a violência
de gênero (para ex-marido, ex-mulher, ex-namorado, etc.), mas, não haverá aplicação da referida lei se a
violência não for de gênero (violência preconceito).
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art.
5º - Omissis.
(...)
Parágrafo único - As
relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.(...)”
- Segundo
Rogério Sanches Cunha, o TJ/SP editou um enunciado dizendo: “o parágrafo único só se aplica para relação
homoafetiva feminina.”, ou seja, a norma (Lei Maria da Penha) só protege a
mulher, pois, não há proteção para o homem, ainda que homossexual.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 6º - A violência doméstica e familiar
contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos.(...)”
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, o art. 6º, da Lei nº 11.340/06 tem o sentido de fundamentar eventual deslocamento de competência, da Justiça
Estadual para a Justiça Federal, que segundo o STJ, só cabe o IDC (incidente de deslocamento de
competência) se falhar a polícia, o MP e o Judiciário do Estado.
7 – Formas de violência doméstica e familiar
contra a mulher
- O
art. 7º, da Lei nº 11.340/06,
traz 5 (cinco) formas de violência:
a) Violência
física (inciso I)
b) Violência
psicológica (inciso II)
c) Violência
sexual (inciso III)
d) Violência
patrimonial (inciso IV)
e)
Violência moral (inciso V)
“Lei nº
11.340/06(...)
Art. 7º - Omissis.
I - a violência física, entendida como
qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; (...)”
-
Segundo a hermenêutica do inciso I, do art.7º, da Lei nº 11.340/06, a violência física abrange desde uma vias de
fato até um homicídio.
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, violência
física pode ser a forma mais
insignificante de violar a saúde de alguém ou até a forma mais drástica, que é ceifar a vida.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 7º - Omissis.
(...)
II - a violência psicológica, entendida
como qualquer conduta que lhe cause dano
emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o
pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou
controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça,
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante,
perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e
limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo
à saúde psicológica e à autodeterminação;(...)”
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, o inciso II, do art.7º, da Lei nº 11.340/06, explica o que é a violência
psicológica contra a mulher.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 7º - Omissis.
(...)
III - a violência sexual, entendida como
qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de
relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da
força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua
sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force
ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,
chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus
direitos sexuais e reprodutivos;(...)”
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, o inciso III, do art.7º, da Lei nº 11.340/06, explica o que é a violência
sexual contra a mulher.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 7º - Omissis.
(...)
IV - a violência patrimonial, entendida
como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou
total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens,
valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer
suas necessidades; (...)”
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, o inciso III, do art.7º, da Lei nº 11.340/06, explica o que é a violência
patrimonial contra a mulher.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 7º - Omissis.
(...)
V - a violência moral, entendida como
qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.(...)”
-
Segundo a hermenêutica do inciso V, do art.7º, da Lei nº 11.340/06, não houve a revogação
do art.181, inciso I, do Código Penal.
“Código Penal
(...)
Art. 181 - É isento de pena quem comete
qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou
ilegítimo, seja civil ou natural.(...)”
- Atenção: Considerando que o art. 181,
do Código Penal dispõe sobre a IMUNIDADE
contra os crimes patrimoniais, logo, o furto
do marido contra mulher tem imunidade. Isto por que, a Lei Maria da Penha NÃO trouxe a revogação da aludida imunidade, de
forma expressa (com a inclusão de nova hipótese no art. 183, do CP).
-
Segundo Rogério Sanches Cunha, configura
analogia in malam partem a interpretação que resultar na aplicação do
inciso V, do art.7º, da Lei nº
11.340/06, pois, as
hipóteses em que as imunidades estão excluídas estão no art. 183, do Código Penal.
“Código Penal
(...)
Art. 183 - Não se aplica o disposto nos dois
artigos anteriores (imunidade):
I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja
emprego de grave ameaça ou violência à pessoa;
II - ao estranho que participa do crime.
III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a
60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741/2003).
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
o fato de haver violência patrimonial como espécie de violência doméstica, não
impede a imunidade do art. 181, do CP. O legislador, se quisesse impedir a
imunidade, o teria feito expressamente.
8 – Medidas Integradas de Prevenção
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 8º - A política pública que visa coibir
a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um
conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes: (...)”
- A
leitura do inciso do art.8º, da Lei
nº 11.340/06, revela que existem 9 (nove) diretrizes para prevenir a violência doméstica e familiar contra
a mulher. Contudo, no tocante aos incisos do art.8º, da Lei nº 11.340/06, alguns tem sido objeto de
grande debate pela doutrina, sendo os principais:
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 8º -Omissis.
(...)
III - o respeito, nos meios de comunicação
social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir
os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e
familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1º, no inciso IV
do art. 3º e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;(...)”
-
Ensina Rogério Sanches Cunha que, segundo o disposto no inciso III, do art.8º, da Lei
nº 11.340/06, um canal de
televisão não pode mostrar
uma mulher apanhando e o homem se dando bem, pois, assim acontecendo,
haveria um incentivo a violência. Todavia, fazer
uma novela para chamar a atenção para o problema é lícito.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 8º -Omissis.
(...)
IV - a implementação de atendimento
policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de
Atendimento à Mulher;(...)”
- O
disposto no inciso IV, do art.8º, da Lei nº 11.340/06 trata da questão Delegacias Especializadas de
atendimento à mulher, pois, o certo é mulher
atendendo mulher.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 8º -Omissis.
(...)
IX - o destaque, nos currículos escolares
de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos,
à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e
familiar contra a mulher.(...)”
- O
disposto no inciso IX, do art.8º, da Lei nº 11.340/06 trata da questão da educação das pessoas em
sociedade acerca da violência doméstica e familiar contra a mulher.
9 – Formas de assistência à mulher vítima
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 9º - A assistência à mulher em situação
de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme
os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social,
no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras
normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.(...)”
-
Segundo a hermenêutica do art.9º, da Lei nº 11.340/06, a mulher
vítima tem tríplice assistência:
a) Assistência social
b) Assistência à saúde (SUS)
c) Assistência à segurança
-
Ensina Rogério Sanches Cunha que a polícia civil é o porto-seguro da mulher
vítima de violência doméstica e familiar, segundo o disposto no art. 11, da Lei
Maria da Penha:
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 11 - No atendimento à mulher em situação
de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras
providências:
I - garantir proteção policial, quando
necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder
Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital
ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III - fornecer transporte para a ofendida
e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a
ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou
do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a
ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.(...)”
-
Rogério Sanches Cunha chama atenção para o § 2º, do art. 9º, da Lei Maria da
Penha, que traz duas medidas de assistência importantes:
“Lei nº
11.340/06
(...)
§ 2º - O juiz assegurará à mulher em
situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade
física e psicológica:
I - acesso prioritário à remoção quando
servidora pública, integrante da administração direta ou indireta;
II - manutenção do vínculo trabalhista,
quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.
(...)”
- Segundo
Rogério Sanches Cunha, o § 2º, do art.
9º, da Lei Maria da Penha orienta que, a maneira de assistir a mulher
vítima é removê-la, porque onde ela está, o marido tem fácil acesso, todo mundo
sabe da vida dela, etc. Todavia, a
aplicabilidade da norma do inciso I, do § 2º, do art. 9º, não é eficaz, vez
que, contempla mais a mulher que exerce função pública, de modo que, ela, por
si mesma, é quem deve buscar sua remoção para outra localidade, onde possa
trabalhar. E no caso do inciso II,
do § 2º, do art. 9º, a mulher
vítima tem direito à manutenção do
vínculo trabalhista por até seis meses.
- A
consequência do inciso II, do § 2º, do
art. 9º, da Lei Maria da Penha, se a mulher vítima não for servidora pública,
em se tratando do afastamento pode ocorrer:
I) O afastamento do trabalho pode ser um
afastamento suspensão e um afastamento interrupção, ambos previstos na CLT, ou
seja, a interrupção é afastamento com salário e a suspensão é afastamento sem
salário.
II) A Lei Maria da Penha fala somente em suspensão, ou seja, afastamento suspensão,
sem salário.
10 - Medidas Protetivas
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 18 - Recebido o expediente com o pedido da
ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas:
I - conhecer do expediente e do pedido
e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;
II - determinar o encaminhamento da
ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;
III - comunicar ao Ministério Público
para que adote as providências cabíveis.
Art. 19 - As medidas protetivas de urgência
poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a
pedido da ofendida.(...)”
- Atenção: As medidas protetivas do
art.18, da Lei Maria da Penha, podem ser concedidas de ofício pelo Juiz.
- Nos
artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha, estão o elenco das medidas protetivas.
“Lei nº
11.340/06
Art. 22 - Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a
mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor,
em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência,
entre outras:
I -
suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão
competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II -
afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III -
proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a)
aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite
mínimo de distância entre estes e o agressor;
b)
contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de
comunicação;
c)
freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida;
IV -
restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de
atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V -
prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
Art. 23 - Poderá o juiz, quando necessário, sem
prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus
dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida
e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da
ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos
e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.(...)”
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
as medidas protetivas dos artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha, tem natureza civil, extrapenal, consoante
demonstrado abaixo:
a) As
medidas protetivas dos artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha têm natureza civil.
b) As
medidas protetivas dos artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha são reguladas pela cautelaridade, ou
seja, o Juiz, para conceder as medidas protetivas de natureza cível, é obrigado a verifica a existência do
binômio fumaça do bom direito e perigo da demora.
c) As
medidas protetivas dos artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha são espécies de tutela de urgência.
d) As
medidas protetivas dos artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha tem o prazo de duração das medidas cautelares,
logo, para perdurarem por mais de 30 dias, deve ajuizada a ação principal.
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
existem três correntes quanto a duração das medidas protetivas dos
artigos 22, 23 e 24, da Lei Maria da Penha:
1ª Corrente - Não ajuizada a ação principal no
prazo de 30 dias, a cautelar caduca. Caducidade
da cautelar. Se a vítima conseguiu
a separação de corpos como medida protetiva, mas não ajuizou a ação principal
de separação judicial no prazo de 30 dias, a separação de corpos caduca.
2ª Corrente - É a corrente moderna, que vem prevalecendo no STJ e é a do
Fredie Didier. A medida de urgência perdura enquanto comprovada a
necessidade. Independentemente do ajuizamento de ação principal, etc. Aliás, a
tendência é nem sequer ligar a ação cautelar à ação principal. Se o juiz
concedeu porque havia o fummus boni iuris e o periculum
in mora, logo, enquanto continuarem o fummus e o periculum, ela
também será perpetuada.
3ª Corrente - Existe uma decisão relativamente
recente dizendo o seguinte: extinto o processo
criminal, restam prejudicadas as medidas protetivas.
- Atenção: O legislador, na Lei Maria da Penha, para garantir que o
agressor cumpra (respeite) a medida protetiva disciplinou a possibilidade de decretação da prisão preventiva,
consoante dispõe o art.20, da
referida lei:
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 20 - Em qualquer fase do inquérito
policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor,
decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou
mediante representação da autoridade policial.(...)”
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
o art. 20, da Lei Maria da Penha, para ser aplicável, foi necessário mudar o disposto
no art. 313, IV, do Código de Processo Penal:
“Código
de Processo Penal
(...)
Art.
313 - Em
qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a
decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos:
I - punidos com reclusão;
II - punidos com detenção, quando se
apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não
fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la;
III - se o réu tiver sido condenado
por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o
disposto no Art. 64, I do Código Penal - reforma penal 1984.
IV - se
o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da
lei específica, para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência. (Acrescentado pela Lei nº 11.340/2006)
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
o Juiz, antes de decretar a prisão preventiva na hipótese de desrespeito da
medida protetiva, deve observar os seguintes critérios:
I) Na
hipótese de desrespeito da medida sem
acarretar a prática de crime – o Juiz não deve decretar a prisão
preventiva.
II)
Na hipótese de desrespeito da medida
para praticar crime – o Juiz deve decretar a prisão preventiva (não
importando o crime).
10 – Organização Judiciária
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 14 - Os Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e
criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos
Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das
causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a
mulher.
(…)
Art. 33 - Enquanto não estruturados os Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais
acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas
decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher,
observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação
processual pertinente.
Parágrafo único - Será
garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o
julgamento das causas referidas no caput.(...)”
- Atenção: Enquanto não forem criados os
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher as varas criminais
acumularão as competências. Contudo, a competência cível que ele acumula não é
um cível total, ou seja, só pode conceder medidas protetivas de urgência, vez
que a ação principal tem que ser proposta na vara da família. Explicando
melhor, se o juiz criminal conceder a separação de corpos, quem tem que separar
judicialmente é o juiz da família.
11 – Procedimento criminal no caso de violência doméstica e
familiar contra a mulher
“Lei nº
11.340/06
Art.
41 - Aos crimes praticados com violência
doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não
se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.(...)” (grifo nosso)
- Atenção: Segundo Rogério Sanches Cunha,
no tocante aos crimes praticados com
violência doméstica e familiar contra a mulher, o procedimento é o ordinário, logo, não se aplica a Lei nº 9.099/95,
vez que trata-se de matéria processual.
PROCEDIMENTO
|
|
CONTRAVENÇÃO PENAL
|
CRIME
|
1.
Termo Circunstanciado
|
1.
Inquérito Policial
|
2.
Audiência preliminar:
a)
Conciliação
b)
Transação
OBS:
Art. 17, da LMP
|
|
3.
Denúncia, que dá início ao processo
|
2.
Denúncia, processo
|
4.
Art. 89 da Lei 9.099/95 (suspensão do processo)
|
|
5.
Julgamento – que pode culminar com a condenação
OBS.:
Art. 17, da LMP
|
3.
Julgamento – que pode culminar com a condenação.
OBS.:
Art. 17, da LMP
|
- Atenção: Segundo o Código de Processo Penal,
art. 25, a representação é retratável
até o oferecimento da inicial (denúncia). Oferecida a denúncia, a representação ela passa a ser
irretratável.
- Atenção: A retratação deve ocorrer na presença do Juiz e do MP, vez que se
trata de uma solenidade para essa retratação.
- Atenção: No tocante ao momento da retratação:
I) Se
a representação está relacionada a fato crime feita fora do ambiente
doméstico e familiar é cabível a
representação até o oferecimento da inicial (denúncia).
II) Se
a representação está relacionada a fato crime ocorrido no ambiente
doméstico ou familiar, é cabível a
representação até o recebimento da inicial (denúncia), mas essa
retratação tem que ocorrer diante do Juiz e do MP.
“Lei nº
11.340/06
(...)
Art. 16 - Nas ações penais públicas
condicionadas à representação (por exemplo, ameaça) da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia (na
verdade, a retratação) à representação perante o juiz, em audiência
especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e
ouvido o Ministério Público.(...)”
- Atenção: No art.16, da Lei Maria da Penha foi cometido um erro técnico no emprego do termo RENÚNCIA, pois, está tem a ver com a
ideia de um direito nunca exercido, ao passo que, a pessoa que se retrata, o
faz de um direito exercido.
- Atenção: No tocante a ação penal, há dois posicionamentos doutrinários:
1ª Corrente: A ação penal é pública
incondicionada, pois o art. 41 impede a aplicação da Lei 9.099/95, documento
que condicionava a ação penal. Não bastasse, a lesão no ambiente doméstico e
familiar, é grave violação de direitos humanos, incompatível com a ação pública
condicionada. (Maioria da doutrina)
2ª Corrente: A
ação penal é pública condicionada. O art. 41 quer evitar as medidas despenalizadoras
exteriores à vontade da vítima, não alcançando a representação.
Referências
GRECO, Rogério. Código Penal
Comentado. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Especial. Vol.
II. 9ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011
CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo
Batista. Violência Doméstica. Lei Maria
da Penha Comentada artigo por artigo. 3ª Ed. São Paulo: RT, 2011.
[1] ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano
Chaves de. Direito
Civil. Teoria Geral.
6 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
Comentários