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AULA DE DIREITO PENAL 5 (LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL)



Tema: A LEI DO DESARMAMENTO (Cont.)

7.4 – Crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido

Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 14 – Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único – O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente. (Vide ADIN 3.112-1)

- O crime do art.14, da Lei nº 10.826/03, tem pena de reclusão de 2 a 4 anos, não sendo possível a suspensão condicional do processo.

- Atenção: Parte da doutrina pátria, considerava o parágrafo único, do art.13, da Lei nº 10.826/03, inconstitucional. Entendimento que foi pacificado pelo STF, quando do julgamento ADIN 3.112, que declarou o art.21, da Lei nº 10.826/03, inconstitucional, vez que contraria o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF/88), além de ofender também a disposição do art. 5º, LXVI, da CF/88, a qual determina que ninguém será preso quando a lei admitir liberdade provisória. Em outras palavras, o inciso LXVI, do art. 5º da CF/88 só poderia admitir, e nunca vedar liberdade provisória.

- O crime do art.14, da Lei nº 10.826/03, dispões sobre as armas de fogo de uso permitido.

- O crime do art.14, da Lei nº 10.826/03 é um delito de ação múltipla ou de conteúdo variado, ou seja, se configura com a prática de mais de uma conduta, dentre as descritas no tipo. Por conseguinte, dentro de um mesmo contexto fático, não configura concurso de crimes, mas sim crime único.

- Atenção: O crime do art.14, da Lei nº 10.826/03 não apresenta o núcleo “vender”.

- Atenção: É o art. 17, da Lei nº 10.826/03, que trata do exercício ilegal de atividade comercial ou industrial, no que se refere a arma de fogo.

- Atenção: O parágrafo único, do art. 17, da Lei nº 10.826/03 trata do exercício ilegal de atividade comercial ou industrial por equiparação, referente a arma de fogo.

- Atenção: Existe uma tese de que, para configuração do crime exercício ilegal de atividade comercial ou industrial em relação à arma de fogo, mesmo na equiparação (parágrafo único, do art. 17, da Lei nº 10.826/03), deve existir a habitualidade e, assim, se o agente vende sua única arma de fogo ilegal, de forma irregular, o fato seria atípico, pois, não há a habitualidade exigida para a configuração do art. 17, nem existe previsão do núcleo vender nos arts. 14 e 16.

- Atenção: É preciso ter cuidado com a tese da habitualidade na configuração do crime exercício ilegal de atividade comercial ou industrial em relação à arma de fogo. Afinal, antes de vender, o agente já havia adquirido (art. 14), já estava portando (art. 14) e já estava possuindo (crime permanente – art. 12) a arma ilegal e, portanto, já poderia responder pelo art. 14 (que absorve o art.12) ou, subsidiariamente, pelo art. 12 e, sendo arma de fogo de uso restrito, responderia pelo crime do art. 16.

- Se o agente pratica atividade comercial ou industrial relativa a arma de fogo, de forma irregular, pouco importa que as armas sejam legais ou ilegais, se houver habitualidade, responderá pelo crime do art. 17, caput ou parágrafo único. Assim ocorre por que se trata do delito de não ter autorização legal para o comércio ou indústria de arma de fogo, ou seja, mesmo que a arma de fogo seja legalizada, só pode ser comercializada de forma habitual se houver a autorização para o comércio (ou indústria).

7.5 – Crime de disparo de arma de fogo ou crime de acionamento de munição

Lei nº 10.826/03
(...)

Art. 15 – Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único – O crime previsto neste artigo é inafiançável. (Vide ADIN 3.112-1)

- O art.15, da Lei do Desarmamento, dispõe sobre o crime de disparo de arma de fogo ou crime de acionamento de munição.

- Na análise do crime de disparo de arma de fogo há previsão de subsidiariedade expressa, pois, somente se aplica o referido delito, do Estatuto do Desarmamento, se o agente não tem por finalidade a prática de outro crime. Ex.: Caio dispara arma de fogo, com a finalidade de praticar o crime de homicídio contra Tício.

- Atenção: Segundo parte da doutrina, o parágrafo único, art. 15, do Estatuto do Desarmamento, seria uma norma inconstitucional, haja vista, que é possível que uma pessoa dispare uma arma de fogo com intenção de praticar um crime menos grave. Exemplos:

I) Caio dispara uma arma de fogo para expor a perigo a vida de Brutus (art.132, do CP).

II) Tício dispara arma de fogo para causar lesão corporal leve na pessoa de Caio (art. 129, caput, do CP)

- Verifica-se nos exemplos, acima citados, que nos crimes praticados a pena máxima não ultrapassa um ano, logo, são delitos de competência do JECrim.

- Atenção: O crime previsto no art. 15, do Estatuto do Desarmamento é infração de maior potencial ofensivo, não sendo da competência do JECrim. Em razão disso, surgiram três correntes:

I) A primeira corrente defende uma análise literal do art. 15, da Lei nº 10.826/03, isto é, se a finalidade é a de praticar outro crime, o agente responde pelo crime que quis praticar, ainda que menos grave, ficando o disparo de arma de fogo absorvido.

- Segundo a primeira corrente, nos exemplos supracitados, o agente responderia apenas pelos crimes dos artigos 132 e 129, caput, do Código Penal. Aplica-se aqui o que a doutrina denomina de Princípio da Finalidade, segundo o qual, o sujeito ativo deve ser punido pelo crime que tinha a finalidade de praticar. Não é caso de aplicado do Princípio da Consunção, pois, assim seria necessário que o crime consumido fosse menos grave do que o crime que o consome.

- Atenção: Há doutrinadores que defendem a tese, com base na primeira corrente, no caso dos exemplos supracitados, onde o agente responderia apenas pelos crimes dos artigos 132 e 129, caput, do Código Penal, que seria caso de aplicação do Princípio da Consunção, pois, entendem que, para que haja consunção, basta que o crime consumido seja caminho necessário para a prática do crime que consome.

II) A segunda corrente defende a tese do crime-fim, ou seja, na hipótese do agente, quando objetiva a prática de um delito através do disparo de arma de fogo, ocorreria a absorção do delito previsto no art. 15,  da Lei nº 10.826/03, se for mais grave do que este.

- Explicando melhor, com base nos exemplos, acima já citados, subsistiria apenas o crime de disparo de arma de fogo (art. 15, da Lei nº 10.826/03), ficando absorvidos os crimes previstos nos artigos 132 ou 129, caput, do Código Penal. Contudo, na hipótese do crime-fim se tratar do crime de homicídio, este absorverá o disparo de arma de fogo (art. 15, da Lei nº 10.826/03).

III) A terceira corrente defende a tese de concurso formal imperfeito entre os crimes previstos nos artigos 132 ou 129, caput, do Código Penal, e o crime do art. 15, do Estatuto do Desarmamento, segundo os exemplos acima mencionados, na hipótese do crime-fim ser menos grave do que o crime previsto no art. 15, do Estatuto do Desarmamento.

- Atenção: No tocante a inconstitucionalidade do parágrafo único, do art.15, da Lei nº 10.826/2003, não há corrente majoritária.

- Atenção: Há doutrinadores que defendem a tese do concurso material (artigos 14 e 15, do Estatuto do Desarmamento), se o agente portar ilegalmente arma de fogo e, depois dispara esta arma.

- Atenção: Há doutrinadores que defendem a existência de um só crime, se o agente portar ilegalmente arma de fogo e, depois dispara esta arma, pois, o bem jurídico tutelado e a pena, são os mesmos. Assim, o agente responderia somente pelo crime de porte ilegal de arma de fogo (art. 14, do Estatuto do Desarmamento). E nesta hipótese, o disparo de arma de fogo (art. 15, do Estatuto do Desarmamento) seria considerado um post factum impunível.

- Atenção: Se o agente tem autorização para portar arma de fogo, não responde pelo crime previsto no art. 14, da Lei nº 10.826/03, mas, se disparar sua arma, responderá pelo crime previsto no art. 15, da mesma lei.

- Atenção: O art. 16, da Lei 10.826/03, prevê pena de 3 a 6 anos para o caso de porte ou posse ilegal de arma de fogo de uso restrito. Assim, se o agente porta ilegalmente uma arma de fogo de uso restrito e faz disparo com esta arma, há doutrinadores que defende a impossibilidade de aplicação do art. 15, do Estatuto do Desarmamento, o qual tem pena menos grave do que a do art. 16, do mesmo estatuto. Nessa hipótese o sujeito ativo responderia apenas pelo porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16), sendo o disparo da arma de fogo, considerado um post factum impunível.

- Atenção: Há doutrinadores que defendem a tese do concurso material entre os delitos previstos nos artigos 16 e 15, da Lei nº 10.826/03.

- Na prática, deve prevalecer a lógica jurídica, resultante da aplicação da teoria e dos princípios de Direito Penal. Exemplo:

“Se um policial militar dispara sua arma de fogo para conter uma multidão enfurecida (agindo no exercício de sua atividade), mas, o projétil, na queda, mata uma pessoa, se ficar comprovado que partiu da arma do policial, este não responderá por disparo de arma de fogo, mas, responderá por homicídio culposo.

O disparo acidental é fato atípico, pois, o crime do art. 15, da Lei nº 10.826/03, só é punido quando praticado a título de dolo. Se, nesse caso, o disparo causar lesão corporal ou morte de outra pessoa, o agente não responderá também por este resultado, salvo se comprovada a existência de culpa (imprudência, negligência ou imperícia no manuseio da arma), pois, se o disparo for totalmente acidental (imprevisível), será totalmente atípico, ainda que cause resultado mais grave.

7.6 – Crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito

Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 16 – Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Parágrafo único – Nas mesmas penas incorre quem:

I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato;

II – modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz;

III – possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar;

IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;

V – vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e

VI – produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.(...)”

- O crime do art.16, do Estatuto do Desarmamento trata das armas de uso restrito.

- O crime do art.16, da lei nº 10.826/03, é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado.

- Atenção: O crime do art.16, do Estatuto do Desarmamento apresenta os mesmos núcleos do art.14, do mesmo estatuto, mas, a pena é de reclusão de 3 a 6 anos. Por conseguinte, de acordo com a pena mínima cominada já se percebe que o crime é inafiançável (art. 323, I do CPP).

- Atenção: Se o agente está portando ilegalmente e ao mesmo tempo, duas armas de fogo de uso permitido, comete apenas o crime do art. 14, do Estatuto do Desarmamento.

- Atenção: Se o agente está portando ilegalmente e ao mesmo tempo, duas armas de fogo de uso restrito, também, não cometerá dois crimes, mas, responde uma única vez pelo delito previsto no art. 16, do Estatuto do Desarmamento.

- Atenção: Se o agente está portando ilegalmente e ao mesmo tempo, duas armas de fogo, mas, uma de uso permitido e outra de uso restrito. Nesse caso surgem dois entendimentos:

I) A primeira corrente defende a existência de um fato único, uma única conduta – portar ilegalmente arma de fogo, pois, o bem jurídico tutelado é o mesmo, o sujeito passivo é o mesmo e, assim, como o art. 16 é mais grave, logo, absorve o art. 14, e o agente responde somente por aquele crime.

II) A segunda corrente defende a existência de concurso de crimes entre o art. 14 e o art.16, do Estatuto do Desarmamento.

- Grande parte da doutrina tem se manifestado favorável a prevalência da primeira corrente, pois, na vigência da Lei nº 9.437/97, quando acontecia a hipótese ventilada, o agente era denunciado apenas pelo crime do seu art. 10, § 2º.

7.6.1 – Análise do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento

- O parágrafo único, do art. 16, do Estatuto do Desarmamento dispõe sobre armas de fogo de uso permitido e de uso restrito.

- O parágrafo único, do art. 16, do Estatuto do Desarmamento refere-se a qualquer arma de fogo (de uso restrito ou permitido). Portanto, é preciso ter atenção, pois, o referido dispositivo não trata apenas de arma de fogo de uso restrito.

- Atenção: O caput, do art.16, do Estatuto do Desarmamento trata de arma de fogo de uso restrito. Inclusive, o nomen iuris (rubrica) do artigo 16 é a seguinte: “posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito”.

- Atenção: A doutrina amplamente majoritária (quase unânime) já se pronunciou no sentido de que o caput, do art. 16, do Estatuto é disposição completamente independente do parágrafo único, do mesmo artigo. Em outras palavras, somente o art. 16, caput é que trata de arma de fogo, acessório e munição de uso restrito.

- Atenção: O parágrafo único, do art. 16, do Estatuto do Desarmamento não usou a expressão “de uso restrito” em nenhum dos seus incisos e, portanto, está tratando de arma de fogo, acessório e munição de uso permitido ou restrito.

- Atenção: Na hipótese do agente que entrega dolosamente arma de fogo a deficiente mental, sendo de uso permitido, o crime será o previsto no art. 14 e, se for de uso restrito, o crime será o previsto no art. 16 do Estatuto do Desarmamento, porque, quanto ao deficiente mental, não há regra expressa para o caso de entregar dolosamente a arma, como acontece no caso de criança e adolescente.

7.6.2 – Análise do incisos III e VI, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento

- Os incisos III e VI, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento, devem ser confrontados com o art. 253, do Código Penal, ou seja, em face da derrogação pelo art. 16, parágrafo único, III e VI, do Estatuto do Desarmamento, a citado artigo do Código Penal continua em vigor, apenas no que diz respeito a gás tóxico e asfixiante.

“Código Penal
(...)
Art. 253 - Fabricar, fornecer, adquirir, possuir ou transportar, sem licença da autoridade, substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou asfixiante, ou material destinado à sua fabricação:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.(...)

7.6.3 – Análise do inciso IV, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento

- O inciso IV, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento pode ser considerado uma qualificadora para o crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido.

- Atenção: Se o agente está portando ilegalmente uma arma de fogo de uso permitido, responde pelo crime do art. 14, do Estatuto do Desarmamento. Se, no entanto, a arma está com a numeração suprimida ou raspada, o crime será o do art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 10.826/03.

- Atenção: No que tange a arma de fogo de uso restrito, não há que se falar em qualificadora, pois, para o porte ilegal de arma de fogo de uso restrito com numeração íntegra, suprimida ou raspada a pena é a mesma.

7.6.4 – Análise do inciso V, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento

- O inciso V, do parágrafo único do art. 16, do Estatuto do Desarmamento é mais específico do que o art.242 da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Em outras palavras, houve a derrogação do art. 242, da Lei nº 8.069/90 que, agora, somente, se aplica aos casos em que a arma não é de fogo.

- Atenção: Tratando-se de arma de fogo, munição, acessório para arma de fogo e explosivo, no caso de criança ou adolescente aplica-se o inciso V, do parágrafo único, do art. 16, do Estatuto do Desarmamento.

- O art. 16, § 2º, “c” do Decreto-Lei nº 3.688/41 prevê a contravenção penal de omissão de cautelas necessárias para impedir que menor de 18 anos, deficiente mental, ou pessoa inexperiente se apodere de arma (de fogo ou que não é de fogo) ou munição.

- Atenção: Se o sujeito, culposamente, deixa que se apodere de arma de fogo, menor de 18 anos ou deficiente mental, comete o crime do art. 13, caput, da Lei nº 10.826/03.

- Atenção: Se o sujeito, culposamente, deixa que se apodere de arma de fogo, permite que menor de 18 anos, deficiente mental ou pessoa inexperiente, se apodere de arma que não é de fogo, comete a contravenção penal do art. 19, § 2º, “c” do Decreto-Lei nº 3.688/41.

- Atenção: Se o sujeito, culposamente, deixa que pessoa inexperiente, se apodere de arma de fogo, surgem alguns entendimentos divergentes:

I) A primeira corrente defende que, se o sujeito, culposamente, deixa que pessoa inexperiente, se apodere de arma de fogo, deve responder pela contravenção penal do art. 19, § 2º, “c” do Decreto-Lei nº 3.688/41, pois, se a lei posterior não dispõe sobre o assunto, não houve revogação tácita da Lei de Contravenções Penais, que continua em vigor.

II) A segunda corrente defende que a Lei nº 10.826/03 não tratou especificamente do assunto, ou seja, tratou das armas de fogo, logo, infere-se que referida legislação teria revogado o art. 19, § 2º, “c” do Decreto-Lei nº 3.688/41, no que pertine a arma de fogo (aplicando-se ao menor de 18 anos, deficiente mental e pessoa inexperiente). Para esta corrente, se a lei posterior, regulou o mesmo assunto, ou seja, omissão de cautela necessária em relação à arma de fogo, mesmo não se referindo a pessoa inexperiente, significa que não quis mais que continuasse vigendo a contravenção penal acima mencionada. Portanto, para esta segunda corrente, a omissão de cautela necessária para impedir que pessoa inexperiente se apodere de arma de fogo, é fato atípico.

7.7 – Crime de comércio ilegal de arma de fogo

“Lei nº 10.826/03

(...)

Art. 17 - Adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

Parágrafo único - Equipara-se à atividade comercial ou industrial, para efeito deste artigo, qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência. (...)”

7.7.1 - Tipo objetivo do crime de comércio ilegal de arma de fogo

- O tipo penal do crime de comércio ilegal de arma de fogo possui 14 verbos, os quais estão ligados a atividade comercial ou industrial, não necessariamente de armas de fogo, bastando que o agente no exercício da atividade comercial, industrial, ainda que irregular ou clandestino, inclusive, o exercido em residência ou prestação de serviços (na forma do parágrafo único), realize uma das condutas previstas em lei.

- Atenção: A configuração do crime de comércio ilegal de arma de fogo exige a prova da permanência da atividade comercial, industrial ou prestação de serviços, não podendo estas serem esporádicas, já que a lei exige que seja no exercício.

- A violação do art.17, da Lei nº 10.826/03, geralmente, são os responsáveis por empresas de segurança, transportadoras, comerciantes e industriais que adquirem armas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar. E também as transportadores que realizem transporte irregular de armas, etc.

7.8 – Crime de tráfico internacional de arma de fogo

“Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 18 - Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente:

Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (...)”

7.8.1 - Tipo objetivo do crime de tráfico internacional de arma de fogo

- O crime de tráfico internacional de arma de fogo trata da conduta de exportação e importação, bem como do favorecimento a importação ou exportação ilegal de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente.

- Atenção: Quanto a importação e a exportação qualquer pessoa pode praticar este crime.

- Atenção: No que concerne a facilitação da importação ou exportação é necessário que o sujeito ativo seja funcionário público, não se aplicando o disposto no art. 318, do Código Penal, por ser o dispositivo do estatuto especial em relação aquele.

8 – Causa de aumento de pena

“Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 19 - Nos crimes previstos nos arts. 17 e 18, a pena é aumentada da metade se a arma de fogo, acessório ou munição forem de uso proibido ou restrito. (...)”

- Segundo o Estatuto do Desarmamento, a causa de aumento de pena de ½ nos crimes dos artigos 17 e 18, do aludido estatuto, ocorrerá em se tratando de arma de uso proibido ou restrito, o que eleva a pena de 6 a 12 anos de reclusão e multa.

“Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 20 - Nos crimes previstos nos arts. 14, 15, 16, 17 e 18, a pena é aumentada da metade se forem praticados por integrante dos órgãos e empresas referidas nos arts. 6o, 7o e 8o desta Lei. (...)”

- Segundo o Estatuto do Desarmamento, ocorrerá a causa de aumento de pena para o caso de agentes mencionados nos artigos nos arts. 14, 15, 16, 17 e 18, ou seja, as legalmente autorizadas para o porte de armas.

9 – Liberdade Provisória

“Lei nº 10.826/03
(...)
Art. 21 - Os crimes previstos nos arts. 16, 17 e 18 são insuscetíveis de liberdade provisória. (...)”

- Segundo previsão do Estatuto do Desarmamento, a concessão de liberdade provisória foi vedada para a aos crimes previstos nos artigos 16, 17 e 18, do aludido estatuto, mas, ao contrário senso, não há vedação para concessão do referido benefício (direito) aos crimes previstos nos artigos 14 e 15, também, do aludido estatuto, embora sejam inafiançáveis, conforme os respectivos parágrafos únicos.

- O Estatuto do Desarmamento estabeleceu uma espécie de “cautelaridade presumida”, na medida em que presume a necessidade da custódia para garantia da ordem pública.  Tal dispositivo não é inconstitucional, na medida em que o art. 5º, inciso LXVI, da CF/88, prevê que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.

- Atenção: Se o magistrado, analisando o caso concreto, bem como as circunstâncias judiciais, chegar a conclusão de que, em caso de condenação, irá aplicar a pena mínima e consequentemente, tanto na hipótese do artigo 16, 17 e 18, substituí-la por uma restritiva de direitos, deve conceder a liberdade provisória, eis que não há razões para a manutenção da custódia cautelar. Caso contrário, se indeferi-la deverá fundamentar sua decisão em circunstâncias ligadas ao caso concreto, bem como aos fundamentos da prisão preventiva, não sendo suficiente a gravidade do crime a justificar a medida excepcional do encarceramento cautelar.

Referências

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CAPEZ, Fernando. Estatuto do Desarmamento: comentários à Lei n° 10.826,  de 22-12-2003. 4.ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

FACCIOLLI, Ângelo Fernando. Lei das Armas de Fogo. Curitiba: Juruá, 2006.

FERNANDES, Leonardo de Medeiros. Sobre o Estatuto do Desarmamento (Lei n° 10.826103). Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 557, 15. jan. 2005. Disponível em:   87>. Acesso em: 11 nov 2014.

FRANCO, Paulo Alves. Estatuto do Desarmamento Anotado. 2. ed. rev. ampl. e atual. Campinas: Servanda, 2005.

GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal: parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Coleção Sinopses Jurídicas. v. 7.

JESUS, Damásio E. Direito Penal: parte geral. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 1.

JESUS, Damásio E. Direito Penal: parte especial: dos crimes contra a pessoa e dos crimes contra o patrimônio. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 2.

JESUS, Damásio E. Direito Penal do Desarmamento: anotações à parte criminal da Lei n° 10.826, de 22 de dezembro de 2003 (Estatuto do Desarmamento). 5. ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2005.

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NUNES, Suas Barbosa. Armas de Fogo: a ineficácia da legislação restritiva. Âmbito Jurídico, Rio Grande, 22, 31.ago.2005. Disponível em: Acesso em: 15 nov 2014.

SILVA, César Dano Mariano da. Estatuto do Desarmamento: de acordo com a Lei n° 10.82612003. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

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EXMO.(A) SR.(A) DR.(A) JUIZ(A) DO TRABALHO DA 0ª VARA DO TRABALHO DE _____ – ___. Ref. Proc. nº _________________________ AVISO DE INADIMPLEMENTO DE ACORDO FULANA DE TAL, já devidamente qualificada nos autos da Reclamação Trabalhista, processo em epígrafe, que move contra EMPRESA DE TAL LTDA , também qualificada, por seu procurador advogado, no fim assinado, vem perante Vossa Excelência, informar o NÃO CUMPRIMENTO DE PARTE DO ACORDO ENTABULADO. MM. Juiz, Segundo esta registrado nos autos, no dia 10/08/2017, foi homologado acordo entre a Reclamante e a Reclamada, na audiência de conciliação e julgamento, tendo sido pactuado o seguinte: “ A reclamada EMPRESA DE TAL LTDA pagará ao autor a importância líquida e total de R$ 4.382,00, sendo R$ 730,33, referente à primeira parcela do acordo, até o dia 11/09/2017, e o restante conforme discriminado a seguir: 2ª parcela, no valor de R$ 730,33, até 10/12/2017. 3ª parcela, no valor de R$ 730,33, a

NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL EM FACE DE PREJUÍZOS CAUSADOS POR EDIFICAÇÃO DE PRÉDIO VIZINHO

Imperatriz/MA, 11 Julho de 2008. Ao ILMO. SR. MARCOS DE LA ROCHE Rua Cegal, nº 245, Centro Imperatriz-MA Prezado Senhor, Utilizo-me da presente comunicação, na qualidade de Advogado contratado por MARIA SOARES SILVA , brasileira, divorciada, vendedora, portadora do RG nº 7777777 SSP-MA e do CPF nº 250.250.250-00, residente e domiciliada na Rua Cegal, nº 555, Centro, Imperatriz-MA, como instrumento para NOTIFICAR Vossa Senhoria, no sentido de proceder aos reparos necessários nas paredes da casa, de propriedade da referida senhora, ou proceda ao pagamento correspondente a compra de materiais de construção e mão de obra, cujas notas e valores respectivos seguem anexos, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas , em face do seguinte: 1) Em 2005 Vossa Senhoria adquiriu uma casa, localizada do lado direito da casa da Srª. MARIA SOARES SILVA ; 2) Em janeiro de 2006, Vossa Senhoria derrubou a casa e iniciou a construção de um outro imóvel, cuja edificação termi

MODELO DE PETIÇÃO DE PURGAÇÃO DA MORA - DE ACORDO COM CPC/2015

EXMO(ª). SR.(ª) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA º VARA CÍVEL DA COMARCA DE __________________-MA. Ref. Proc. nº IDENTIFICAÇÃO DA PARTE REQUERIDA, já devidamente qualificado nos autos da Ação de Busca e Apreensão, processo em referência, que fora ajuizada por IDENTIFICAÇÃO DA PARTE REQUERENTE , também qualificada, por seu bastante procurador e advogado, no fim assinado, conforme documento procuratório em anexo (doc.01), com escritório profissional na Rua _______________, nº ____, Centro, Cidade, onde recebe intimações, notificações e avisos de praxe e estilo, vem perante Vossa Excelência, na melhor forma do direito, apresentar PEDIDO DE PURGAÇÃO DA MORA Nos seguintes termos: O Requerido celebrou contrato de consórcio com o banco .... , ora Requerente, visando a aquisição de veículo automotor. Em decorrência do contrato, o Requerido passou a integrar o GRUPO DE CONSÓRCIO nº ........... e, através de contemplação