A decisão que segue, do Juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara Criminal de Palmas (TO), foi prolatada em 2003. Contudo, demonstra a forma como um Jurista, a se ver diante de normas estatais para aplicação em um determinado caso, resolve fazer JUSTIÇA.
É sem sombra de dúvidas uma decisão singular, construída com base em argumentos sociais, políticos e econômicos, os quais têm relação direta com a forma como o Direito é aplicado em sociedade. Não aquele Direito para quem tem dinheiro (poder econômico), mas, sim, um Direito para quem tem sede de Justiça. Saul e Hagamenon são brasileiros, que tiveram a oportunidade de serem julgados de forma JUSTA, sem apego a fundamento legal, porém, com base em forte argumento jurídico. Eis a decisão para ser analisada:
DECISÃO PROFERIDA PELO JUIZ RAFAEL GONÇALVES DE PAULA NOS AUTOS DO PROC Nº 124/03-3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas/TO:
Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)…
Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário apesar da promessa deste presidente que muito fala, nada sabe e pouco faz.
Poderia brandir minha ira contra os neoliberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização europeia…
Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra – e aí, cadê a Justiça nesse mundo?
Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.
Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o motivo. Expeçam-se os alvarás. Intimem-se. Rafael Gonçalves de Paula.
RAFAEL GONÇALVES DE PAULA
Juiz de Direito.
É sem sombra de dúvidas uma decisão singular, construída com base em argumentos sociais, políticos e econômicos, os quais têm relação direta com a forma como o Direito é aplicado em sociedade. Não aquele Direito para quem tem dinheiro (poder econômico), mas, sim, um Direito para quem tem sede de Justiça. Saul e Hagamenon são brasileiros, que tiveram a oportunidade de serem julgados de forma JUSTA, sem apego a fundamento legal, porém, com base em forte argumento jurídico. Eis a decisão para ser analisada:
DECISÃO PROFERIDA PELO JUIZ RAFAEL GONÇALVES DE PAULA NOS AUTOS DO PROC Nº 124/03-3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas/TO:
Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)…
Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário apesar da promessa deste presidente que muito fala, nada sabe e pouco faz.
Poderia brandir minha ira contra os neoliberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização europeia…
Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra – e aí, cadê a Justiça nesse mundo?
Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.
Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o motivo. Expeçam-se os alvarás. Intimem-se. Rafael Gonçalves de Paula.
RAFAEL GONÇALVES DE PAULA
Juiz de Direito.
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