Tema: A
Teoria da Lei Penal
1 -
Objetivos e finalidade do Direito Penal
1.1 -
O que é Direito Penal?
- Em
resposta, Johannes Wessels[1]
expõe que o Direito Penal designa a parte
do ordenamento jurídico que determina os pressupostos de punibilidade, bem como
os caracteres específicos da conduta punível, cominando determinadas penas e
prevendo, a par de outras consequências jurídicas, especialmente medidas de
tratamento e segurança.
- Segundo Leonardo Pache de Faria Cupello[2]
o Estado, ao definir os comportamentos
criminosos, exerce o seu poder de intervir coercivamente quando o indivíduo age
de maneira contrária à ordem jurídica praticando uma conduta socialmente
reprovável, tipificada na norma penal.
E por esta razão entende o referido jurista que o Direito
Penal é um instrumento de valorização ética capaz de dimensionar o poder
punitivo do Estado e a sua influência no corpo social.
1.2 –
Qual o objeto do Direito Penal
- O
Direito Penal tem por objeto dirigir os seus
comandos legais ao homem, proibindo ou mandando que se faça algo,
pois somente este é capaz de executar ações com
consciência do fim.
1.3 -
Finalidade do Direito Penal
- A finalidade
do Direito Penal é proteger os bens mais importantes e necessários para a
própria sobrevivência da sociedade, ou nas precisas palavras de Luiz Regis
Prado, “o pensamento jurídico moderno reconhece que o escopo imediato e
primordial do Direito Penal radica na proteção de bens jurídicos - essenciais
ao indivíduo e à comunidade”.
2 - Fontes
do Direito Penal
2.1 -
Conceito Fontes do Direito
- A fonte
do Direito, segundo os doutrinadores, está relacionada com a própria gênese da lei,
significando tudo aquilo que impulsiona
o surgimento da norma jurídica.
2.2 –
Classificação das Fontes do Direito Penal
- No
Direito Penal as fontes se dividem em duas categorias:
I – Fontes
materiais do Direito Penal ou fontes de produção.
II – Fontes formais do Direito Penal, também conhecidas por fontes de
cognição ou de conhecimento. E também são denominadas de fonte imediata ou fonte mediata.
2.3 -
Fonte material ou de produção
- A fonte material está relacionada com a
produção da norma penal, ou seja, diz respeito ao órgão encarregado de
elaboração da norma penal.
- A fonte de produção é o Estado (Federação
brasileira), segundo se infere do disposto no art. 22, I, da CF/88, que
estabelece a competência privativamente à União legislar sobre direito penal.
- A
nossa Carta Magna é categórica ao dizer que, somente à União é a única fonte de produção de normas gerais de Direito
Penal, estabelecendo as proibições ou impondo determinadas condutas
(comissivas ou omissivas), sob a ameaça de sanção. Todavia, o parágrafo único, do art. 22, da CF/88,
de forma excepcional, prevê que “lei
complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas
das matérias relacionadas neste artigo”. Norma esta que foi criada com o objetivo de regionalizar determinadas
questões penais, criminalizando certas condutas. Situação esta, que não se tem
notícia de ter sido colocada em prática.
2.4 –
Fontes formais ou de cognição ou de conhecimento
- As fontes formais ou de cognição ou de
conhecimento dizem respeito ao modo de exteriorização
do Direito Penal e podem ser imediata (ou direta) e
mediata (ou indireta ou secundária).
2.4.1
- Fonte formal imediata
- A
única fonte formal imediata é a lei (em sentido estrito), vez que, somente
esta pode criar crimes e cominar penas. Mas,
existem várias espécies legislativas, sendo as seguintes:
a) Lei Complementar – norma
que pode tratar de matéria penal, uma vez que possui processo legislativo mais
complexo do que a lei ordinária. Ex.: O art. 10, da Lei Complementar nº
105/2001, que instituiu o crime de quebra de sigilo fora das hipóteses autorizadas
na mesma Lei.
- Atenção: A doutrina contém posições
contrárias à ideia de que a lei complementar pode tratar de matéria penal.
Argumento que se baseia na ideia de que o rol da lei complementar é exaustivo
na Constituição Federal, não incluindo
nenhuma hipótese de criação de lei penal. Além do que é exigido quorum qualificado
para elaborar uma lei complementar, o que iria engessar o Congresso Nacional se
houvesse necessidade de modificar lei penal que fosse criada pelo processo
qualificado.
b) Lei Delegada: norma
jurídica elaborada pelo Presidente da República, que não pode tratar de matéria penal, haja visto que, o art. 68, § 1º, II,
da CF/88 veda a delegação em matéria de direitos individuais, entre
os quais está o princípio da reserva legal (art. 5º, XXXIX, da CF). Ademais, o procedimento legislativo,
que exige intenso debate dos congressistas sobre as propostas de alteração da
legislação penal, restaria enfraquecido, sem trâmite pelas duas Casas
Legislativas e sem apresentação de emendas.
c) Medida Provisória: norma
jurídica que não pode disciplinar matéria
penal em face de expressa previsão constitucional (art. 62, § 1º, I, b, da
CF), conforme alteração advinda pela Emenda Constitucional nº 32/2001. Antes de tal EC, no entanto, essa
questão era controvertida, tendo ocorrido casos de leis penais criadas por MPs,
como a Lei nº 7.960/89 (Lei da Prisão Temporária), acrescendo tipo penal à Lei
nº 4.898/65, que trata do abuso de autoridade.
d) Emenda à Constituição: norma
jurídica que, em tese, pode tratar de
matéria penal, haja vista tratar-se de norma elaborada pelo Poder Constituinte
Derivado ou Reformador. Ademais, não há vedação expressa nesse sentido. No
entanto, a teor do art. 60, § 4º, da CF, a EC não poderá restringir direitos e
garantias individuais.
2.4.2
- Fontes formais mediatas
- São fontes formais mediatas o costume, os princípios gerais de direito
e o ato administrativo, porém, a doutrina pátria elenca nesse rol,
os tratados e convenções, a equidade, a doutrina e a jurisprudência.
2.4.2.1
- Costume
- O costume é a repetição da conduta, de
maneira constante e uniforme, em razão da convicção da sua obrigatoriedade
jurídica. Todavia, em razão do princípio da reserva legal, o
costume não pode criar crimes e nem cominar penas.
- O
costume, de fato, continua eficaz em outros ramos do Direito,
principalmente naqueles pautados pela common law.
- Atenção: O costume não revoga a lei, em face do
que dispõe o art. 2º, § 1º, da LINDB
– Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga LICC, conforme alteração advinda da Lei nº 12.376/2010), segundo o qual uma lei só pode ser revogada por outra lei.
2.4.2.2
- Princípios gerais de direito
- Os princípios gerais de direito funcionam,
geralmente, no caso de lacunas (na lei), servindo de elemento de completude do direito. Neste contexto, dispõe o art. 4º da
LINDB: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
- Os princípios gerais de direito são
premissas de cunho moral e ético retiradas do processo legislativo. Tais princípios não podem ser fontes de
incriminação de condutas. Todavia, no
campo das normas não-incriminadoras,
é possível a utilização dos princípios gerais de direito para ampliar as causas de exclusão do delito.
2.4.2.3
- Ato administrativo
- Em algumas
normas penais em branco, o
complemento da definição da conduta criminosa dependerá de um ato da Administração Pública.
- Exemplo: No delito de omissão de
notificação de doença, previsto no art.
269, do Código Penal, é um ato administrativo que irá elencar o rol de doenças cuja
notificação é compulsória, servindo, dessa forma, como fonte formal
mediata do Direito Penal.
3 - Norma
Penal e Lei Penal
3.1 –
Explicando o que é a Lei
- A lei é a única fonte imediata de
conhecimento jurídico. É comum, porém,
o uso da expressão “norma” no
sentido da categoria de princípios
legais, não obstante a norma penal esteja contida na lei penal.
- A norma
segundo Kelsen[3] tem o sentido de um ato de vontade.
"Norma”
dá a entender a alguém que alguma coisa deve ser ou acontecer, desde que a
palavra “norma”
indique uma prescrição, um mandamento. Sua expressão lingüística é um
imperativo ou uma proposição de dever-ser.
O
ato, cujo sentido é que alguma coisa está ordenada, prescrita, constitui um ato
de vontade. Aquilo que se torna ordenado, prescrito, representa, prima facie,
uma conduta humana definida. Quem ordena algo, prescreve, quer que algo deva
acontecer.
O
dever-ser – a norma – é o sentido de um querer, de um ato de vontade, e – se a
norma constitui uma prescrição, um mandamento – é o sentido de um ato dirigido
à conduta de outrem, de um ato, cujo sentido é que um outro (ou outros) deve (ou
devem) conduzir-se de determinado modo.” (grifo nosso)
-
Segundo a professora Maria Helena Diniz[4]
a lei, em sentido jurídico, é um texto oficial, que abarca um conjunto
de normas, ditadas pelo poder constituído (Poder Legislativo), que integra a
organização do Estado, sua elaboração é disciplinada por norma constitucional,
derivada do poder originário (todo poder emana do povo) e o Estado garante sua
execução compulsória (coativa). Ademais, a expressão lei pode ser utilizada em dois sentidos:
I - Lei em sentido amplo, ou seja, em
sentido abrangente, pois, todo e qualquer ato que descreva ou regulamente uma
determinada conduta, mesmo que esse ato não tenha sido elaborado pelo Poder
Legislativo. É o caso das medidas
provisórias, sendo atribuição do Presidente da República, que, diante de
uma situação de urgência e relevância, edita uma norma, a qual se transformará em lei depois de passar pela avaliação
do Poder Legislativo.
II - Lei em sentido estrito, ou seja, aquela
que foi elaborada pelo Poder Legislativo, vez que é detentora de todos os
requisitos necessários, tanto os que dizem respeito ao conteúdo
(abstratividade, generalidade, bilateralidade, imperatividade e coercitividade),
quanto os relativos à forma (processo legislativo).
- O conceito de lei
penal, segundo Cordeiro Celeste Santos[5],
se encontra estruturado pelo tipo legal
(nullum crimen sine lege) e pela sanção penal (nulla poena sine lege).
Explicando melhor, em toda lei penal incriminadora há duas partes distintas:
1) O preceito primário (ou simplesmente preceito ou preceptum juris), no qual se verifica a definição da conduta criminosa;
2) O
preceito secundário (ou sanção ou sanctio
juris), no qual se verifica a
respectiva sanção penal.
3.2 -
Classificação das Leis Penais
- As leis penais classificam-se em:
a) Leis penais incriminadoras - são
as que criam crimes e impõem as respectivas sanções. Essa espécie pode ser encontrada na Parte Especial do Código Penal
e na legislação penal extravagante.
b) Leis penais não-incriminadoras - são
as que não criam crimes e nem cominam penas.
Além do que, se encontram subdivididas nas seguintes espécies:
I - Leis penais permissivas - são
as que autorizam a prática de determinadas condutas típicas. Esta espécie de lei penal está presente na Parte Geral do Código
Penal. Ex.: art. 23, do CPB (que trata da legítima defesa e do estado de
necessidade). Mas, também é verificável, embora com escassez, na Parte Especial
do CPB.
Ex.: arts. 128 e 142, do CPB;
II - Leis penais exculpantes - são
as que estabelecem a inculpabilidade
do agente ou a impunidade de
determinadas condutas típicas e ilícitas.
Esta espécie de lei penal está presente na Parte Geral do Código Penal: art. 26, caput (inimputabilidade por doença mental); art. 27 (inimputabilidade
pela menoridade do agente), e no art.107, inciso IV (prescrição). E também,
na Parte Especial do Código Penal: no
art. 312, § 3º, 1ª parte; e no art. 342, § 2º;
III - Leis penais explicativas, interpretativas ou
complementares - são as que esclarecem o conteúdo de outras normas penais, ou delimitam
o âmbito de sua aplicação. Ex.: O art.
10, do CPB, que trata da contagem do prazo penal; o art. 13, caput, 2ª parte, do CPB, que trata do conceito de
causa; o art. 150, § 4º, do CPB, que
trata do conceito de casa; e o art. 327
do CPB, que trata do conceito de funcionário público;
IV - Leis penais diretivas - são aquelas
que estabelecem princípios de determinada matéria, como o Princípio da Reserva Legal. Esta espécie de lei penal pode ser
encontrada no art. 1º, do CPB;
V - Leis penais finais complementares ou de
aplicação - são aquelas que fixam limites de validade das normas incriminadoras. Esta espécie de lei penal pode ser
encontrada nos artigos 2º e 5º, todos do
CPB.
c) Leis penais de ampliação, de extensão ou
integrativas - são as que complementam a tipicidade do fato. Esta espécie de lei
penal se verifica no art. 14, II, do
CPB, que trata da tentativa e no
art.29, do CPB, que trata da participação.
d) Leis penais completas - são aquelas
que definem todos os elementos da figura típica. Esta espécie de lei penal encontra-se no art.121, do CPB, que
trata do crime de homicídio.
e) Leis penais incompletas - são
as que reservam o complemento da figura típica a outra norma, ou também, a um ato administrativo,
ou ainda, ao juiz. Esta espécie de
lei penal corresponde as leis penais em
branco e os tipos penais abertos.
3.3 -
As Leis Penais em Branco
- A
expressão “lei em branco” foi
utilizada, pela primeira vez, por Binding, para chamar aquelas normas que, não obstante contenham
sanção penal determinada, seu respectivo preceito primário não é formulado
senão como proibição genérica, devendo
ser complementado por outra lei (em sentido amplo).
3.3.1
- Classificação das leis Penais em Branco
- As leis penais em branco classificam-se em:
a) Leis penais em branco homogêneas ou em sentido
lato ou impróprias - são aquelas em que o complemento
provém da mesma fonte formal da norma incriminadora. Explicando melhor, o órgão encarregado de formular o complemento
é o mesmo órgão elaborador da lei penal em branco.
- Atenção: No caso de leis penais em branco homogêneas há uma subdivisão nas seguintes
espécies:
I - No caso de uma lei penal ser
complementada por lei penal - a norma penal em branco homogênea
será identificada por HOMOVITELÍNEA.
Ex.: O crime de prevaricação,
previsto no art. 319, do CPB, é complementado pelo art. 327, do mesmo
CPB, definindo ‘funcionário público’;
II – No caso da lei
penal ser complementada por lei extrapenal - a
norma penal em branco homogênea será identificada por HETEROVITE-LÍNEA. Ex.: O crime
de “contrair casamento conhecendo a existência de impedimento que lhe cause a
nulidade absoluta”, previsto no art. 237, do CPB, é complementado pelo
art. 1.521, do Código Civil de 2002.
b) Leis penais em branco heterogêneas ou em
sentido estrito ou próprias - são aquelas cujo complemento está
contido em norma que procede de outra instância legislativa. Explicando melhor, é a lei
penal complementada por ato normativo infralegal, como uma portaria ou um
decreto. Ex.: O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, previsto
no art. 14, caput, do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/03), remete ao chamado R-105 (Decreto nº 3.665/00), que define efetivamente o que é arma,
o que é acessório e o que é munição.
- Atenção: O penalista espanhol Mir Puig cita, ainda, uma terceira classificação de lei penal em
branco:
“leis penais
em branco ao avesso
(também chamadas de normas penais em
branco ao revés ou invertidas), que
existem quando, embora completo o preceito primário, o preceito secundário fica
a cargo de norma complementar. Observe-se a Lei de Genocídio (Lei nº 2.889/56), que não traz pena específica
para o genocídio, mas sim remete às sanções penais
de outras infrações. Exemplo:
quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico,
racial ou religioso, matar membros desse grupo, será punido com as penas do
homicídio qualificado.”
(grifo nosso)
3.3.2
- A lei penal em branco na nova Lei de Drogas
- A Lei nº 11.343/06 adotou uma terminologia diversa da usada pela Lei
n.º 6.368/76 e a Lei nº 10.409/02, ambas já revogadas, ou seja, ao invés da
expressão “substância entorpecente” foi utilizada a expressão “droga”.
- O
conceito legal de drogas informa que são
substâncias
entorpecentes ou produtos capazes de causar dependência, e que estejam
especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas, de forma periódica,
pelo Poder Executivo da União (parágrafo único. do art. 1º, da Lei nº 11.343/06). Por conseguinte, trata-se de lei penal em
branco, haja vista que necessita de complementação por meio de preceito administrativo (Portaria SVS/MS
344/98, atualizada pela Resolução ANVISA 178/02).
3.4 -
Tipos Penais Abertos
- Os tipos penais abertos correspondem a
uma espécie de lei penal incompleta.
- Explicando melhor, os tipos penais abertos diferem das leis penais em branco no tocante a modo de complementação, ou seja,
enquanto estas são complementadas por outra lei (leis penais em branco homogêneas) ou por ato administrativo (leis penais em branco heterogêneas), naquelas a definição da conduta criminosa é complementada pelo magistrado, através
de um juízo valorativo.
- São
exemplos de tipos penais abertos: Os
crimes culposos; O crime de rixa (art. 137, do CPB); O crime de ato obsceno
(art. 233, do CPB).
3.5 -
Destinatários da Lei Penal
- O preceito primário da lei penal tem valor erga omnes, ou seja, se
dirige a todas as pessoas. Contudo, no tocante ao preceito secundário o mesmo se dirige aos juízes, os quais são os detentores do dever de punir.
- Atenção: O preceito
secundário não pode se dirigir ao transgressor da norma, pois não existe um
dever de autopunição.
4 - Eficácia
da Lei Penal no Tempo
- Nascer,
viver e morrer são etapas do fenômeno temporal, e assim também acontece com a
lei penal, a qual nasce, vive e morre. A lei
penal em sua eficácia, não alcança os fatos ocorridos antes ou depois dos
dois limites extremos, ou seja, não retroage nem tem ultra-atividade. Esse é o
principio "tempus regit actum (o tempo rege o ato), isto é, a lei aplicável à repressão da prática do
crime é a lei vigente ao tempo de sua execução.
4.1 -
Lei Excepcional ou Temporária
“Código Penal
(...)
Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora
decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a
determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.(...)”
- As leis auto-revogáveis são também chamadas
de lei de vigência temporária. Elas comportam
duas espécies: a lei excepcional e a lei temporária.
- A leis penais
temporárias são aquelas que possuem vigência previamente fixada pelo
legislador. É este quem determina quando a lei entre em vigência e a sua
duração (até certa data).
- As leis penais
excepcionais são aquelas promulgadas em casos de calamidade pública,
guerras, revoluções, cataclismos, epidemias etc. Essa espécie normativa têm
vigência enquanto durar a situação de anormalidade.
- As
leis penais temporárias e excepcionais
são denominadas como leis auto-revogáveis, não
derrogam o princípio da reserva legal, pois não se aplicam a fatos ocorridos
antes de sua vigência.
- As leis penais
temporárias e excepcionais são
ultra-ativas, no sentido de continuarem a ser aplicadas aos fatos
praticados durante sua vigência, mesmo depois de sua auto-revogação. Assim,
mesmo que o fato, já praticado sob a vigência de
uma lei temporária ou excepcional, seja julgado após a auto-revogação desta, já sob a vigência de uma lei comum mais
benéfica que tenha recobrado sua eficácia, esta não poderá retroagir, haja
vista o mandamento do art. 3º, do Código Penal.
- Exemplos:
“Durante período de violenta estiagem, entrou em
vigor lei considerando contravenção penal o desperdício de água (lavação de
veículos, irrigação de jardins). Quatro meses depois, cessada a calamidade, a
lei perdeu sua eficácia.”
“Para prevenir a extinção de determinada espécie
marinha, foi promulgada lei, com prazo de vigência fixado em dois anos,
considerando crime a sua pesca.”[6]
4.2 - Tempo do Crime
“Código Penal
(...)
Art.
4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que
outro seja o momento do resultado.(...)”
- Tempo
do crime – momento em que se considera praticado o
delito.
- Existem três teorias a respeito do tempo do
crime, sendo as seguintes:
I -
Teoria da Atividade – segundo a qual se considera praticado o
delito no momento da ação ou omissão, aplicando-se ao fato a lei em vigor nessa
oportunidade;
II -
Teoria do Resultado – segundo a qual se considera praticado o
delito no momento da produção do resultado, aplicando-se ao fato a lei em vigor
nessa oportunidade;
III -
Teoria Mista ou da Ubiqüidade, segundo a
qual o tempo do crime é indiferentemente o momento da ação ou do resultado,
aplicando-se qualquer uma das leis em vigor nessas oportunidades.
-
Atenção: O Código Penal
Brasileiro adotou a Teoria da Atividade, nos termos do art.4º, da aludida lei.
- Exemplo:
Segundo Fernando Capez[7] um menor de 17 anos
e 11 meses esfaqueia uma senhora, que vem a falecer, em conseqüência desses
golpes, 3 meses depois. Não responde pelo crime,
pois era inimputável à época da infração. No caso de crime permanente, como a
conduta se prolonga no tempo, o agente responderia pelo delito.
-
Atenção: Em matéria de prescrição, o Código
Penal adotou a Teoria do Resultado. Ou seja, o lapso temporal começa a
correr a partir da consumação, e não do
dia em que se deu a ação delituosa. (art. 111, I, do CP).
4.3 - Princípios relativos à Lei Penal no Tempo
- Os princípios
relativos à lei penal no tempo são aplicados quando se estabelece um conflito entre
duas ou mais normas aparentemente aplicáveis ao mesmo fato. Há conflito porque
mais de uma norma pretende regular o fato de forma aparente.
4.3.1 – Elementos
que caracterizam conflito entre duas ou mais normas
aparentemente aplicáveis ao mesmo fato:
a) Unidade de fato (há somente uma infração penal);
b) Pluralidade de normas (duas ou mais normas
pretendendo regulá-lo);
c) Aparente aplicação de todas as normas à espécie
(aparente incidência de todas);
d) Efetiva aplicação de apenas uma delas.
4.3.2 - Solução
de conflitos entre duas ou mais normas aparentemente aplicáveis ao mesmo fato:
ocorre com a aplicação dos seguintes princípios
a) Princípio da especialidade;
b) Princípio da subsidiariedade;
c) Princípio da consunção;
d) Princípio da alternatividade.
4.3.2.1 – Princípio
da Especialidade
– Segundo o Princípio da Especialidade, a lei especial prevalece sobre a geral, a qual deixa de incidir
naquela hipótese.
- Exemplos:
1) Fernando Capez[8] explica que a norma do art. 123, do Código Penal, que trata do infanticídio
prevalece sobre o art. 121, que cuida do
homicídio, porque possui além dos elementos genéricos deste último, os
seguintes especializantes: “próprio filho”, “durante o parto ou logo após”, “sob influência do
estado puerperal.”
2) Segundo Fernando Capez[9], para o delito de importar cocaína,
aparentemente há duas normas que se aplicam no caso, quais sejam – do art. 334, do Código Penal (contrabando) e o art.33, da Lei nº 11.343/06 (tráfico de drogas). O
tipo penal de tráfico de drogas é especial em relação ao contrabando e, por
isso, aplicável ao caso.
3) O tipo fundamental também é excluído pela forma
privilegiada ou qualificada. Assim, o furto privilegiado (Art. 155, § 2º, do
Código Penal) e o qualificado (Art. 155, § 4º, do Código Penal) prevalecem
sobre o furto simples (Art. 155, caput, do Código Penal).
4.3.2.2 – Princípio
da Subsidiariedade
– Segundo o Princípio da Subsidiariedade, norma
subsidiária é aquela que descreve um grau menor de violação de um mesmo
bem jurídico, isto é, um fato menos amplo e menos grave, o qual, embora
definido como delito autônomo, encontra-se também compreendido em outro tipo
penal como fase normal de execução de crime mais grave.
- Na
expressão de Nélson Hungria a norma subsidiária funciona como um soldado de
reserva. Em outras palavras, tenta-se aplicar a norma primária, e somente
quando isso não se ajustar ao fato concreto, recorre-se subsidiariamente à
norma menos ampla.
- O
fenômeno da subsidiariedade verifica-se nas hipóteses em que diferentes normas
protegem o mesmo bem jurídico em diferentes fases.
- O Princípio da Subsidiariedade orienta que há fatos mais
graves (constante do dispositivo legal) que abarcam fatos menos grave. Desta forma,
não sendo possível aplicar a norma (ou dispositivo legal) por inteiro,
aplica-se a menos grave. Em outras palavras, O
TIPO PENAL ABRANGE OUTROS TIPOS MENORES (crime complexo).
Exemplos:
1) O crime de ameaça
(Art. 147, do CP) cabe no crime de constrangimento
ilegal mediante ameaça (art. 146, do CP), o qual, por sua vez, cabe dentro
do crime de extorsão (art. 158, do CP);
2) O crime de sequestro
(art. 148 do CP) cabe no crime de extorsão
mediante sequestro (art. 159, do CP).
3) O crime de disparo de
arma de fogo (art. 15 da Lei nº
10.826/2003) cabe no crime de homicídio cometido
mediante disparo de arma de fogo (art. 121, do
CP).
4.3.2.3 – Princípio
da Consunção
– O Princípio da Consunção, segundo Fernando Capez[10],
se constitui em fundamento jurídico, onde um fato crime mais amplo e mais grave
consome os fatos menos graves, isto é, trata-se de absorção de fatos menos
amplos e graves, que funcionam como fase normal de preparação ou execução do
crime. Ex.: Para consumar
o crime de homicídio (art. 121 do CP) com uma marreta é necessário causar
lesões corporais (art. 129 do CP) na vítima. Neste caso, a norma (dispositivo
legal – artigo do código) não abrange o tipo penal menos grave. Portanto, há consunção quando um crime
é meio necessário ou fase normal de preparação ou de execução de outro crime.
4.3.2.3 – Princípio
da Alternatividade
– O Princípio da Alternatividade
se constitui em fundamento jurídico,
segundo o qual, uma norma penal descreve
várias formas de realização da figura típica, em que a realização de uma ou de
todas configura um único crime.
-
Verifica-se o Princípio da Alternatividade nos chamados de
crimes de ação múltipla. Ex.: O art. 33,
da Lei nº 11.343/06 (Lei de Drogas) que descreve dezoito formas de prática do tráfico ilícito de
entorpecentes, mas
tanto a realização de uma quanto a de várias modalidades configurará sempre um
único crime.
“Lei nº
11.343/06
(...)
Art. 33
- Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,
vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo,
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar:
Pena - reclusão de
5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa.(...)”
[1] WESSELS, Johannes. Direito penal:
parte geral: aspectos fundamentais. Tradução do original alemão e notas por
Juarez Tavares. Sérgio Antonio Fabris Editor. Porto Alegre: [s.n.], 1976.
[2] CUPELLO, Leonardo Pache de Faria.
Direito Penal e Processual Penal luso-brasileiro. Breves Reflexões. Editora
Juruá, 2003, Pág. 17.
[3] KELSEN, Hans. Teoria Geral das
Normas. Tradução de José Florentino Duarte. Porto Alegre, Fabris, 1986. p. 01.
[4] DINIZ, Maria Helena. Lei de
Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretado. 5a ed. São Paulo: Saraiva,
1999 – p. 42/43.
[5] SANTOS, Cordeiro Celeste. A
Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Responsabilidade Penal da Pessoa
Jurídica e medidas provisórias de Direito Penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, v. 2. Coleção Temas Atuais de Direito Criminal, p.440-441.
[6] BASTOS
JÚNIOR, Edmundo José de. Código Penal em Exemplos Práticos. Florianópolis: Ed. Terceiro Milênio. 1998.
p. 18
[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 66.
[8] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 68.
[9] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 68.
[10] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 71.
Referências
ARAGÃO, Antonio Moniz Sodré de. As três escolas penais. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1938.
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal.
3ª ed. Rio de janeiro: Revan, 2002.
BASTOS JÚNIOR, Edmundo José de. Código Penal em Exemplos Práticos. Florianópolis: Ed. Terceiro Milênio. 1998.
BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro.
8ª ed. Rio de janeiro: Revan, 2002.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo:W V C
BITENCOURT, César Roberto. Manual de direito penal - parte geral.São
Paulo: Editora RT, 1999.
BRUNO, Anibal. Direito Penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1967.
CALÓN, Cuello. La moderna penología. Barcelona:Bosch,
1958.
CAPEZ, Fernando.
Curso de Direito Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004.
COSTA JR.,Paulo José da. Curso de Direito Penal. São Paulo:
Saraiva. 1992.
CUPELLO, Leonardo Pache de Faria.
Direito Penal e Processual Penal luso-brasileiro. Breves Reflexões. Editora
Juruá, 2003.
DINIZ, Maria
Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretado. 5a ed. São
Paulo: Saraiva, 1999.
ESPINAR, José Miguel Zugaldía. Fundamentos de derecho penal. Valencia:
Tirant lo Blanch, 1993.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. 28ª
ed. Petrópolis: Vozes, 2004.
FROMM, Erich. Anatomia de destrutividade humana. Rio de Janeiro:
Zahar, 1975. LEAL, João José. Direito Penal Geral. São Paulo: Atlas.1998
JIMENEZ DE ASÚA,
Luis. Principios de Derecho Penal: La Ley y el
Delito. Buenos Aires: Editorial Sudamericana,
1997. p.24.
KELSEN, Hans.
Teoria Geral das Normas. Tradução de José Florentino Duarte. Porto Alegre,
Fabris, 1986.
MUNÕZ CONDE, Francisco. Introduccion al Derecho
Penal. Buenos Aires: BdeF, 2001.
NORONHA, Edgar Magalhães. Direito
penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1954. v. 1.
NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. São Paulo: Saraiva. 2003
PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral.
São Paulo: Ed. RT, 1999.
SANTOS, Cordeiro
Celeste. A Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Responsabilidade Penal da
Pessoa Jurídica e medidas provisórias de Direito Penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, v. 2. Coleção Temas Atuais de Direito Criminal.
SANTOS, Fátima Ferreira Pinto dos. Os novos
rumos do direito penal: uma perspectiva para além da modernidade.
Disponível em http://www.trinolex.com.
[consulta em 28/07/2014]
SILVA,César Dário Mariano da. Manual de Direito Penal: parte geral.
São Paulo: Edipro. 2002.
VEIGA, Basileu Garcia. Direito penal. 2.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. v. 1.
WESSELS, Johannes. Direito penal:
parte geral: aspectos fundamentais. Tradução do original alemão e notas por
Juarez Tavares. Sérgio Antonio Fabris Editor. Porto Alegre: [s.n.], 1976.
[1] WESSELS, Johannes. Direito penal:
parte geral: aspectos fundamentais. Tradução do original alemão e notas por
Juarez Tavares. Sérgio Antonio Fabris Editor. Porto Alegre: [s.n.], 1976.
[2] CUPELLO, Leonardo Pache de Faria.
Direito Penal e Processual Penal luso-brasileiro. Breves Reflexões. Editora
Juruá, 2003, Pág. 17.
[3] KELSEN, Hans. Teoria Geral das
Normas. Tradução de José Florentino Duarte. Porto Alegre, Fabris, 1986. p. 01.
[4] DINIZ, Maria Helena. Lei de
Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretado. 5a ed. São Paulo: Saraiva,
1999 – p. 42/43.
[5] SANTOS, Cordeiro Celeste. A
Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Responsabilidade Penal da Pessoa
Jurídica e medidas provisórias de Direito Penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, v. 2. Coleção Temas Atuais de Direito Criminal, p.440-441.
[6] BASTOS
JÚNIOR, Edmundo José de. Código Penal em Exemplos Práticos. Florianópolis: Ed. Terceiro Milênio. 1998.
p. 18
[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 66.
[8] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 68.
[9] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 68.
[10] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal: parte geral, vol.1. Ed. 7º. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 71.
Comentários