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AULA DE DIREITO PENAL


1 – Ordenamento jurídico e Ciência Penal

1.1 - O que é o Ordenamento Jurídico?

- Segundo Norberto Bobbio[1] só se pode falar de Direito onde haja um complexo de normas formando um ordenamento, e que, portanto, o Direito não é norma, mas um conjunto coordenado de normas, sendo evidente que uma norma jurídica não se encontra jamais só, mas está ligada a outras normas com as quais forma um sistema normativo.

- Para Bobbio a Teoria do Ordenamento Jurídico constitui uma integração da Teoria da Norma Jurídica, e que foi levado a esta integração pelos resultados a que chegou na busca de uma definição do Direito do ponto de vista da norma jurídica, considerada isoladamente, mas que teve de alargar os seus horizontes para a consideração do modo pelo qual uma determinada norma jurídica se torna eficaz a partir de uma complexa organização que determina a natureza e a entidade das sanções, as pessoas que devem exercê-las e sua execução, e que essa organização complexa é o produto de um ordenamento jurídico, o que significa que uma definição do Direito só é possível se nos colocarmos do ponto de vista do ordenamento jurídico.

1.2 - O que é a Ciência Penal?

- Para entender o conceito de Ciência Penal, se faz necessário citar a Doutora Bartira Macedo de Miranda Santos[2], a qual leciona que:

“(...) Ciência Penal designa-se o conjunto de saberes científicos relacionados ao conhecimento do crime e do sistema punitivo. Por esta expressão estão abarcadas a Criminologia, com suas teorias explicativas do crime, do criminoso, da vítima, da sociedade criminógena e do sistema de reação ao crime; o Direito Penal, enquanto detentor da competência de esclarecer, com base na legislação vigente, quais são as condutas criminosas e qual a pena correspondente, a fim de estabelecer a necessária limitação do poder punitivo; o Direito Processual Penal, que estabelece as regras e os procedimentos legais para o julgamento dos acusados e a aplicação das penas, regulamentando/limitando a atuação do Estado no exercício do poder punitivo; a Política Criminal que, no seu discurso oficial, assume o compromisso de, por meio das descobertas científicas da Criminologia, orientar na escolha das opções legislativas no âmbito do direito penal, processual penal, execução penal etc.(...)” (grifo nosso)

1.3 - O que é a Dogmática Penal?

- Na visão de Luis Jimenez de Asúa, existe a Dogmática Penal, que se constitui em um método (com todos os limites que são inerentes a qualquer método) de investigação, conhecimento, interpretação e crítica de um objeto específico, que é o Direito Penal[3]. Afinal, segundo a lição de Munõz Conde[4], somente uma atividade humana pode ter um método, o que não é o caso do Direito Penal (conjunto normativo).

- A ciência penal ou dogmática penal é apenas uma das maneiras possíveis de se estudar o delito, dedicando-se a investigá-lo na sua dimensão propriamente jurídica. Ao seu lado, outras disciplinas não dogmáticas estão voltadas para o estudo do crime e das leis penais, a partir de um outro enfoque, como por exemplo, a sociologia criminal, a história do direito penal, a filosofia penal, dentre outras.

- A título de ilustração, o cientista do direito penal pretende alcançar uma conclusão fundamentada acerca da possibilidade da cólera ou estado de embriaguez do agente afastar o caráter delituoso de sua conduta. Assim agindo, com o objetivo de orientar o profissional do direito no exercício de sua atividade de natureza técnica, para indicar qual a melhor solução para o problema concreto que ele possa vir a enfrentar na prática.

- A ciência jurídico-penal tem por missão “satisfazer as necessidades da administração da justiça”, ou seja, esta disciplina pretende-se valiosa por servir de maneira eficiente à finalidade de aplicação do direito, nas palavras de Santiago Mir Puig[5].

2 – Conceito/definição de Direito Penal

- Para o jurista Von Liszt Direito Penal era entendido como “o conjunto das prescrições emanadas do Estado, que ligam ao crime, como fato, a pena como conseqüência[6].

- Edmund Mezger ao falar do Direito Penal o definia como “o conjunto das normas jurídicas que regulam o exercício do poder punitivo do Estado, associando ao delito, como pressuposto, a pena como conseqüência”.[7]

- O professor Edgar Magalhães Noronha[8], por sua vez, definia o Direito Penal nos seguintes termos: “conjunto de normas jurídicas que regulam o poder punitivo do Estado, tendo em vista os fatos de natureza criminal e as medidas aplicáveis a quem os pratica”.

- O professor Basileu Garcia Veiga[9], ao ensinar o Direito Penal, defendia que o mesmo se trata de um “conjunto de normas jurídicas que o Estado estabelece para combater o crime, através das penas e medidas de segurança”.

3 - O Direito Penal como regra de controle social

- Na visão de José Miguel Zugaldía Espinar[10], não é possível se imaginar uma comunidade sem controle social, onde estariam ausentes as normas de conduta e convivência, sem sanções adequadas à quebra de regras e onde não houvesse a aplicação da norma sancionadora quando há o descumprimento de tais regras. Por conseguinte, segundo o referido pensador, o Direito Penal se caracteriza por dois fundamentos: ser um instrumento de controle social primário e por ser um instrumento de controle social formalizado. (grifo nosso)

- O Direito Penal é controle social primário quando tem por objetivo amenizar as ações delitivas por meio de suas penalidades e, se constitui em instrumento de controle social formalizado, quando se pauta pela regulamentação, através de normas positivadas, nos termos do princípio da legalidade (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei).

4 - O Direito Penal e seu caráter fragmentário

- O caráter fragmentário do Direito Penal significa, em síntese, que uma vez escolhidos aqueles bens fundamentais, comprovada a lesividade e a inadequação das condutas que os ofendem, esses bens passarão a fazer parte de uma pequena parcela, que é protegida pelo Direito Penal, originando-se, assim, sua natureza fragmentária. Em outras palavras, não é tudo que o Direito Penal vai tutelar, mas somente uma parte (fragmento) do que é mais importante a sociedade. Neste contexto, as ações meramente imorais não são tuteladas, tais como a mentira, a conduta homossexual, a prostituição do próprio corpo etc.

5 - O Direito Penal e as novas exigências sociais no Estado Democrático de Direito.

- As novas exigências sociais no Estado Democrático de Direito, além de impor a submissão de todos perante a lei, também dever editar normas que possuam conteúdo e adequação social, ou seja, devem ser definidas como infrações apenas os fatos que realmente coloquem em risco bens jurídicos fundamentais para a sociedade.

- Ou melhor, a norma penal, em um Estado Democrático de Direito deve, obrigatoriamente, selecionar, dentre os comportamentos humanos, somente aqueles que possuam real lesividade social. Do contrário, haverá uma colisão de tais normas com a Constituição e, um atentado aos princípios básicos da dignidade humana.

- Fátima Ferreira Pinto dos Santos[11], no artigo Os novos rumos do direito penal: uma perspectiva para além da modernidade defende que o uso da razão foi condicionante para o desenvolvimento/progresso do capitalismo e do controle social, a quem serve o Direito Penal. Tese que complementa nos seguintes termos:

“(...) Algumas das respostas da modernidade no campo penal viriam com a humanização das penas, com o fim das penas cruéis e infamantes e com o declínio da aplicação da pena de morte. Por outro lado, pelo lado da crise do modelo repressor, os modelos de prisão baseados no Panóptico benthaniano – manter o detento sob vigilância constante, os olhos atentos, vigilantes e disciplinadores do Estado a reter isolado o preso dos demais presos e estes da sociedade, falharam fragorosamente. Do mesmo modo, as idéias de prevenção geral e especial não surtiram os efeitos desejados pelo Estado e pela sociedade, qual seja a diminuição da criminalidade: o grande monstro com que se depara hoje a sociedade e o Estado brasileiro.

Entretanto, a mercê dos passos efetivados pela modernidade e seu inegável avanço em relação ao Direito Penal do antigo regime, fato é que continuamos a mexer numa ferida que só tem crescido. Estamos navegando ao sabor do vento. Ora falamos de abolicionismo penal – para os mais radicais –, ora exaltamos o minimalismo penal como soluções para os problemas vigentes; e em outra ponta o nosso legislador já se afigura com normas que tendem a efetivar cada vez mais o chamado “Movimento de Lei e Ordem”, inspirado em situações como da Baia de Gantânamo, nascido nas entranhas do imperialismo norte americano. Como exemplo podemos citar a edição da Lei dos Crimes Hediondos e da Lei do Crime Organizado.(...)

- Alessandro Baratta[12], entendendo que o Direito Penal é um direito desigual, aponta que se deve empreender dois movimentos:

"1°) instituir a tutela penal em campos que afetem interesses essenciais para a vida, a saúde e o bem-estar da comunidade;

2°) contrair ao máximo o sistema punitivo, com a descriminalização pura e simplesmente ou substituindo-as por formas de controle legal não estigmatizantes, como por exemplo sanções de ordem administrativas e civis. O que acarretaria uma profunda transformação no processo e na organização judiciária, bem como nas instituições policiais"[13].

- Ainda em terceiro lugar, nas palavras de Alessandro Baratta, considerando o fracasso da prisão em todas as suas funções – controlar a criminalidade, reinserir o condenado à vida social[14] -, lutar pela abolição da pena de prisão[15]. Para tanto sugere:

"a) implantação de “substitutivos penais;
b) ampliação de formas de suspensão condicional de execução e livramento condicional;
c) introdução de formas de execução em regime de semiliberdade;
d) reavaliação do trabalho carcerário;
e) abertura da prisão para a sociedade, mediante a colaboração de órgãos locais"[16].

6 - Metodologia do Direito Penal, como ciência de conteúdo jurídico.

- Se o que se pretende demonstrar como fim último do Direito Penal é, como aspirou Feuerbach, a tutela de direitos subjetivos, o método mais adequado seria partir de tais direitos e reconhecer, como fonte de saber penal, a Filosofia. De outra banda, se o que se pretende é tutelar o direito objetivo, a tendência é aceitar que o método seja reduzido à vontade do legislador. Ou melhor, o método no Direito Penal tem sido alterado e utilizado como forma de manutenção do status quo. A depender do discurso que se pretende legitimar, modifica-se o caminho em prol de novos objetivos.

- A questão do método sempre foi variável em relação ao Direito Penal, a depender da ideologia da época, do contexto histórico e de fatores sociais. Pode-se observar esta nítida variação no tópico referente às Escolas Penais.

7 - Evolução histórica do Direito Penal

- O tópico em estudo, abaixo transcrito, se encontra no artigo Evolução histórica do Direito Penal e Escolas Penais, de Ana Clélia Couto Horta[17]:

Importância do conhecimento histórico para desfazer preconceitos e alargar horizontes” (João José Leal)

O estudo da evolução histórico-penal é de suma importância para uma avaliação correta da mentalidade e dos princípios que nortearam o sistema punitivo contemporâneo.

A história humana não pode ser desvinculada do direito penal, pois desde o princípio o crime vem acontecendo. Era necessário um ordenamento coercitivo que garantisse a paz e a tranqüilidade para a convivência harmoniosa nas sociedades.

A história do Direito Penal é a história da humanidade. Ela surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou”.

Os estudiosos subdividem a história do direito penal em algumas fases. Fases estas que não se sucederam de forma linear ou totalmente rígida (os princípios e características de um período penetravam em outro). São elas:

Vingança Privada

A pena em sua origem, nada mais foi que vindita, pois é mais compreensível que naquela criatura, dominada pelos instintos, o revide à agressão sofrida devia ser fatal, não havendo preocupações com a proporção, nem mesmo com sua justiça” (Edgar Magalhães Noronha)

Quando ocorria um crime a reação a ele era imediata por parte da própria vitima, por seus familiares ou por sua tribo. Comumente esta reação era superior à agressão, não havia qualquer idéia de proporcionalidade.

Esta ligação foi definida por Eric Fromm[18] como sendo um vínculo de sangue, ou seja, era “um dever sagrado que recai num membro de determinada família, de um clã ou de uma tribo, que tem de matar um membro de uma unidade correspondente, se um de seus companheiros tiver sido morto”.

Foi um período marcado por lutas acirradas entre famílias e tribos, acarretando um enfraquecimento e até a extinção das mesmas. Deu-se então o surgimento de regras para evitar o aniquilamento total e assim foi obtida a primeira conquista no âmbito repressivo: a Lei de Talião (jus talionis).

O termo talião de origem latina tálio + onis, significa castigo na mesma medida da culpa. Foi a primeira delimitação do castigo: o crime deveria atingir o seu infrator da mesma forma e intensidade do mal causado por ele.

O famoso ditado “olho por olho, dente por dente” foi acolhido como principio de diversos códigos como o de Hamurabi[19] e pela Lei das XII Tábuas (Lex XII Tabularum).

Com o passar do tempo á própria Lei de Talião evoluiu, surgindo a possibilidade do agressor satisfazer a ofensa mediante indenização em moeda ou espécie (gado, vestes e etc). Era a chamada Composição (compositio).

A composição é, assim, uma forma alternativa de repressão aplicável aos casos em que a morte do delinqüente fosse desaconselhável, seja porque o interesse do ofendido ou dos membros de seu grupo fosse favorável à reparação do dano causado pela ação delituosa”. (João José Leal)

Vingança Divina

É o direito penal imposto pelos sacerdotes, fundamentalmente teocrático; o Direito se confundindo com a religião.

O crime era visto como um pecado e cada pecado atingia a um certo deus. A pena era um castigo divino para a purificação e salvação da alma do infrator.

Era comum neste período o uso de penas cruéis e bastante severas.
Seus princípios podem ser verificados no Código de Manu (Índia)[20] e no Código de Hamurábi, assim como nas regiões do Egito, Assíria, Fenícia, Israel e Grécia.

Se alguém furta bens do Deus ou da Corte deverá ser morto; e mais quem recebeu dele a coisa furtada também deverá ser morto” (Código de Hamurábi – art.6º).

Vingança Pública

Período[21] marcado pelas penas cruéis (morte na fogueira, roda, esquartejamento, sepultamento em vida) para se alcançar o objetivo maior que era a segurança do monarca. Com o poder do Estado cada vez mais fortalecido, o caráter religioso foi sendo dissipado e as penas passaram a ter o intuito de intimidar para que os crimes fossem prevenidos e reprimidos.

Os processos eram sigilosos, o réu não sabia qual era a imputação feita contra ele, o entendimento era de que, sendo inocente, o acusado não precisava de defesa; se fosse culpado, a ela não teria direito. Isso favorecia o arbítrio dos governantes.

Direito Penal Romano

De inicio, em Roma, a religião e o direito estavam intimamente ligados, o Pater Famílias consistia no poder de exercitar o direito de vida e de morte (jus vitae et necis) sobre todos os seus dependentes, inclusive mulheres e escravos.

Com a chegada da Republica Romana ocorreu uma ruptura e desmembramento destes dois alicerces, a vingança privada foi abolida passando ao Estado o magistério penal.

Roma foi o marco inicial do direito moderno principalmente no âmbito civil. No penal, embora tímido, conseguiram destacar o dolo e a culpa e o fim da correção da pena (...)” César Dário

Os romanos contribuíram para a evolução do direito penal fazendo a distinção do crime, do propósito, do ímpeto, do acaso, do erro, da culpa leve, do simples dolo e dolo mau (dolus malus), além do fim de correção da pena.

 Direito Penal Germânico

O Direito era visto como uma ordem da paz; desta forma o crime seria a quebra, a ruptura com este estado.

Inicialmente eram utilizadas a vingança e a composição, porém, com a invasão de Roma, o poder Estatal foi consideravelmente aumentado, desaparecendo a vingança.

As leis bárbaras caracterizavam-se pela composição, onde as tarifas eram estabelecidas conforme a qualidade da pessoa, o sexo, idade, local e espécie da ofensa. Para aqueles que não pudessem pagar eram atribuídas as penas corporais.

Também adotaram a Lei de Talião e, conforme o delito cometido, utilizavam a força para resolver questões criminais.

Eram admitidas também as ordálias ou juízos de Deus (provas de água fervendo, ferro em brasa...), assim como os duelos judiciários, onde o vencedor era proclamado inocente.

 Direito Canônico

É o ordenamento jurídico da Igreja Católica Apostólica Romana.
O vocábulo canônico é derivado da palavra kánon, que significava regra e norma, com a qual originariamente se indicava qualquer prescrição relativa à fé ou à ação cristã.

Inicialmente o Direito Canônico tinha o caráter meramente disciplinar, porém com o fortalecimento do poder papal, este direito passou atingir a todos da sociedade (religiosos e leigos).

Tinha o objetivo de recuperação dos criminosos através do arrependimento, mesmo que fosse necessária a utilização de penas e métodos severos.

Os delitos eram classificados em:

*delicta eclesiástica: ofendido o direito divino, o julgamento era de competência dos tribunais eclesiásticos. A punição do infrator era dada em forma de penitências.

*delicta mere secularia: quando a ordem jurídica laica fosse lesionada a competência era dos tribunais do Estado. O infrator era punido com penas comuns.

*delicta mixta: delitos que violavam a ordem laica e a religiosa; a competência do julgamento era do primeiro tribunal que tomasse conhecimento do delito.

Esse direito deu uma atenção ao aspecto subjetivo do crime, combateu a vingança privada com o direito de asilo e as tréguas de Deus, humanizou as penas, reprimiu o uso das ordálias e introduziu as penas privativas de liberdade (ocorriam nos monastérios em celas) em substituição às patrimoniais.

A penitenciária foi criada por este Direito: seria um local onde o condenado não cometeria crimes, se arrependeria dos seus erros e por fim se redimiria podendo voltar ao convívio social.

Os tribunais eclesiásticos não costumavam aplicar as penas capitais até o período conhecido como a Inquisição[22]. Neste período passou-se a empregar a tortura, o processo inquisitório dispensava prévia acusação e as autoridades eclesiásticas agiam conforme os seus valores e entendimentos. Foi um período marcado por muitas atrocidades...

Período Humanitário

Em fins do século XVIII com a propagação dos ideais iluministas, ocorreu uma conscientização quanto às barbaridades que vinham acontecendo, era preciso romper com os convencionalismos e tradições vigentes. Houve um imperativo para a proteção da liberdade individual em face do arbítrio judiciário e para o banimento das torturas, com fundamento em sentimentos de piedade, compaixão e respeito à pessoa humana.

Almejava-se  uma lei penal que fosse simples, clara, precisa e escrita em língua pátria, deveria ser também severa o mínimo necessário para combater a criminalidade, tornando assim o processo penal rápido e eficaz.

Cesare de Bonesana, o Marques de Beccaria, saiu em defesa dos desafortunados e dos desfavorecidos em sua obra “Dos delitos e das penas” (Dei Delitti e Delle Pene). Opôs-se às técnicas utilizadas até então pela justiça, era contra a prática da tortura como meio de produção de prova e por fim combateu o sistema presidiário das masmorras. Foi um verdadeiro grito contra o individualismo.

Baseou-se na Teoria do Contrato Social, investiu contra a pena capital, com o argumento de que, apesar  do homem ceder parte de sua liberdade ao Bem Comum, não poderia ser privado de todos os seus direitos e a ninguém seria conferido o poder de matá-lo.

A lei que autoriza a tortura é uma lei que diz: homens, resisti à dor” (Beccaria)
Beccaria dividiu o crime em duas espécies:

* Crimes horrendos - aqueles que são fruto da violação das convenções sociais e ligados ao bem estar comum como o direito de propriedade e também os homicídios.

*Admitia que havia crimes menos graves que o homicídio e  ainda os delitos, como o adultério.
Beccaria foi um marco decisivo para a modificação do Direito Penal, veja algumas de suas citações mais importantes:

 Sobre a Impunidade:

“É, porém, em vão que procuro abafar os remorsos que me afligem, quando autorizo as santas leis, fiadoras sagradas da confiança pública, base respeitável dos costumes, a proteger a perfídia, a legitimar a traição. E que opróbrio para uma nação, se os seus magistrados tornados infiéis, faltassem à promessa que fizeram e se apoiassem vergonhosamente em vãs sutilezas, para levar ao suplício aquele que respondeu ao convite das leis”.

Sobre a moderação das penas: estas deveriam ser preventivas e não retributivas.

"Toda severidade que ultrapasse os limites se torna supérflua e, por conseguinte, tirânica".

O que pretendeu Beccaria não foi certamente fazer obra de ciência, mas de humanidade e justiça, e, assim, ela resultou num gesto eloqüente de revolta contra a iniqüidade, que teve, na época, o poder de sedução suficiente para conquistar a consciência universal. (...) falou claro diante dos poderosos, em um tempo de absolutismo, de soberania de origem divina, de confusão das normas penais com religião, moral, superstições, ousando construir um Direito Penal sobre bases humanas, traçar fronteiras à autoridade do príncipe e limitar a pena à necessidade da segurança social. Defendeu, assim, o homem contra a tirania, e com isso encerrou um período de nefanda (perversa) memória na história do Direito Penal”. (Aníbal Bruno)
Outras figuras importantes também surgiram neste período, tais como:

John Howard, em seu livro The State of Prision in England, relatou a situação das prisões européias, propondo um tratamento mais digno aos presos (direito ao trabalho, a uma alimentação sadia, assistência religiosa...). John Howard é considerado por muitos como o pai da Ciência Penitenciária.

Jeremias Bentham, o qual postulou que o castigo era um mal necessário para se prevenir maiores danos à sociedade, embora admitisse o seu fim correcional.
Sua obra mais significativa foi a Teoria das Penas e das Recompensas.

A sua maior contribuição foi o pan-óptico[23], em que descrevia a arquitetura e os problemas de uma penitenciária.
Além destes citem-se também os reformadores Servan (Discurso sobre a administração da justiça criminal); Marat (Plano de legislação criminal) e Lardizábal (Discurso sobre las penas).(...)” (grifos nossos)

Referências

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BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. 3ª ed. Rio de janeiro: Revan, 2002.

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 8ª ed. Rio de janeiro: Revan, 2002.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: W V C

BITENCOURT, César Roberto. Manual de direito penal - parte geral.São Paulo: Editora RT, 1999.

BRUNO, Anibal. Direito Penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1967.

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VEIGA, Basileu Garcia. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. v. 1.




[1] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico, 10. Ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1999, p. 19-34.
[2] SANTOS, Bartira Macedo de Miranda. A MODERNA CIÊNCIA PENAL: A ESPECIALIZAÇÃO DOS SABERES E SUA FUNÇÃO IDEOLÓGICA. 2013. (Apresentação de Trabalho/Comunicação). Disponível em http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=6fbb2c2ee065c77a
[3] JIMENEZ DE ASÚA, Luis. Principios de Derecho Penal: La Ley y el Delito. Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1997. p.24.
[4] MUNÕZ CONDE, Francisco. Introduccion al Derecho Penal. Buenos Aires: BdeF, 2001. p.211.
[5] MIR PUIG, Santiago.  El derecho penal en el Estado social y democrático de derecho. Barcelona: Ariel, 1994.
[6] Tratado de direito penal. Madri: Reus, 1927.
[7] Tratado de derecho penal. Madri: Revista de Derecho Privado, 1955. p. 3.
[8] NORONHA, Edgar Magalhães. Direito penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1954. v. 1, p. 1.
[9] VEIGA, Basileu Garcia. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. v. 1, p. 62.
[10] ESPINAR, José Miguel Zugaldía. Fundamentos de derecho penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 1993. 
[12] BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. 3ª ed. Rio de janeiro: Revan, 2002.
[13] BARATTA, apud, Batista, 2002, p. 37
[14] A prisão trás ainda o marcante selo estigmatizador dos que por ela passam e ainda ao contrário do que se propõe, ela dessocializa o indivíduo. Ocorre a chamada prisionização: o detento absorve os modos de vida do presídio, seus códigos, suas leis. Por isso diz-se sempre ser a prisão a verdadeira “escola do crime”. É a graduação dos que violaram as normas de convívio social e as normas jurídicas.
[15] Se a sociedade atual ainda necessita da prisão como meio de punição e exemplo, e se ainda não se pode renunciar à sua existência, se ela é, como dizia Foucault (2004, p. 195), a detestável solução de que não se pode abrir mão, então, que se destine a crimes mais graves, mas que também sejam aplicadas às exigências humanitárias condizentes com o Estado Democrático de Direito.
[16] BARATTA, apud, Batista, 2002, p. 38
[17] HORTA, Ana Clélia Couto. Evolução historica do Direito Penal e Escolas Penais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n. 21, maio 2005. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=514>. Acesso em jul 2014.
[18] FROMM, Erich. Anatomia de destrutividade humana. Erich Fromm foi grande psicanalista alemão (1900-1980)
[19] Código de Hamurabi (2.300 a.C.), código feito pelo rei da Babilônia, Khammu-rabi. 
[20] Código de Manu (Índia, 1300 a.C)
[21] Também chamado de Época dos Suplícios, a tortura era utilizada para descobrir a “verdade” sobre o crime.
[22] Vocábulo de origem latina Inquisitione. Antigo tribunal eclesiástico que teve início com o Concilio de Latrão (1215) instituído com a finalidade de investigar e punir os crimes contra a fé católica.
[23] O termo pan-óptico quer dizer “que permite uma visão total”.

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