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AULA SOBRE A TEORIA DA TUTELA CAUTELAR (TUTELA PROVISÓRIA) NO CPC DE 2015



TEORIA SOBRE TUTELA CAUTELAR E TUTELA SATISFATIVA[1]

OBS.: A TEORIA AQUI EXPLANADA ESTÁ DE ACORDO COM O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (LEI Nº 13.105/15)

1 – TUTELA PROVISÓRIA: ANTECIPAÇÃO PROVISÓRIA DOS EFEITOS DA TUTELA DEFINITIVA

1.1 - Generalidades

- A entrega de todo tipo de tutela definitiva demora, necessariamente. O processo exige tempo.

- A rigor, o tempo é um mal necessário para a boa tutela dos direitos. É imprescindível um lapso temporal considerável (e razoável) para que se realize plenamente o devido processo legal e todos os seus consectários, produzindo-se resultados justos e predispostos à imutabilidade. É garantia de segurança jurídica. Bem pensadas as coisas, o processo "demorado" é uma conquista da sociedade: os "poderosos" de antanho poderiam decidir imediatamente.

- O que atormenta o processualista contemporâneo, contudo, é a necessidade de razoabilidade na gestão do tempo, com olhos fixos na:

I) demora irrazoável, o abuso do tempo, pois um processo demasiadamente lento pode colocar em risco a efetividade da tutela jurisdicional, sobretudo em casos de urgência; e na

II) razoabilidade da escolha de quem arcará com ônus do passar do tempo necessário para concessão de tutela definitiva, tutelando-se provisoriamente aquele cujo direito se encontre em estado de evidência.

- Essa seria a função constitucional das tutelas provisória: a harmonização de tais direitos fundamentais (segurança e efetividade) em tensão.

- Em situação de urgência, o tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva (satisfativa ou cautelar) pode colocar em risco sua efetividade. Este é um dos males do tempo do processo[2].

- Em situação de mera evidência (sem urgência), o tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva (satisfativa) não deve ser suportado pelo titular de direito assentado em afirmações de fato comprovadas, que se possam dizer evidentes. Haveria, em tais casos, violação ao princípio da igualdade.

- No intuito de abrandar os efeitos perniciosos do tempo do processo, o legislador instituiu uma importante técnica processual: a antecipação provisória dos efeitos finais da tutela definitiva, que permite o gozo antecipado e imediato dos efeitos próprios da tutela definitiva pretendida (seja satisfativa, seja cautelar).

- A principal finalidade da tutela provisória é abrandar os males do tempo e garantir a efetividade da jurisdição (os efeitos da tutela). Serve, então, para redistribuir, em homenagem ao princípio da igualdade, o ônus do tempo do processo, conforme célebre imagem de Luiz Guilherme Marinoni. Se é inexorável que o processo demore, é preciso que o peso do tempo seja repartido entre as partes, e não somente o demandante arque com ele. Esta é a tutela antecipada, de nominada no CPC/2015 como "tutela provisória"[3].

- A tutela provisória confere a pronta satisfação ou a pronta asseguração. E a decisão que concede tutela provisória é baseada em cognição sumária e dá eficácia imediata à tutela definitiva pretendida (satisfativa ou cautelar). Por ser provisória, será substituída por uma tutela definitiva, que a confirme, revogue ou modifique.

1.2. Características da tutela provisória

- A tutela provisória é marcada por três características essenciais:

a) a sumariedade da cognição, vez que a decisão se assenta em análise superficial do objeto litigioso e, por isso, autoriza que o julgador decida a partir de um juízo de probabilidade;

b) a precariedade. A princípio, a tutela provisória conservará sua eficácia ao longo do processo, ressalvada a possibilidade de decisão judicial em sentido contrário (art. 296, parágrafo único, CPC). Mas ela poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo (art. 296, caput, CPC)[4]

A revogação ou modificação de uma tutela provisória só pode dar-se, porém, em razão de uma alteração do estado de fato ou de direito ou do estado de prova - quando, por exemplo, na fase de instrução, restarem evidenciados fatos que não correspondam àqueles que autorizaram a concessão da tutela[5].

c) e, por ser assim, fundada em cognição sumária e precária, a tutela provisória é inapta a tornar-se indiscutível pela coisa julgada[6].

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 296 - A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.

Parágrafo único - Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.

1.3. Espécies de tutela provisória: satisfativa (antecipada) e cautelar

- Atenção: Qualquer tutela definitiva, e somente a tutela definitiva, pode ser concedida provisoriamente. As espécies de tutela definitiva são, por isso, as espécies de tutela provisória.

- A tutela provisória pode ser, então, satisfativa ou cautelar. Pode-se, assim, antecipar provisoriamente a satisfação ou a cautela do direito afirmado.

- A tutela provisória satisfativa antecipa os efeitos da tutela definitiva satisfativa, conferindo eficácia imediata ao direito afirmado. Adianta-se, assim, a satisfação do direito, com a atribuição do bem da vida. Esta é a espécie de tutela provisória que o legislador resolveu denominar de "tutela antecipada" (terminologia inadequada).

- A tutela provisória cautelar antecipa os efeitos de tutela definitiva não-satisfativa (cautelar), conferindo eficácia imediata ao direito à cautela. Adianta-se, assim, a cautela a determinado direito. Ela somente se justifica diante de uma situação de urgência do direito a ser acautelado, que exija sua preservação imediata, garantindo sua futura e eventual satisfação (arts. 294 e 300, CPC).

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 294 - A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.
Parágrafo único - A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
[...]
Art. 300 – A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

- A tutela provisória cautelar tem, assim, dupla função:

1) é provisória por dar eficácia imediata à tutela definitiva não-satisfativa; e

2) é cautelar por assegurar a futura eficácia da tutela definitiva satisfativa, na medida em que resguarda o direito a ser satisfeito, acautelando-o.

2 - REGIME JURÍDICO DA TUTELA PROVISÓRIA: REGRAS GERAIS

2.1. Fundamento: urgência ou evidência

- Na forma do art. 294, CPC, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 294 - A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.[...]

- As tutelas provisórias de urgência (satisfativa ou cautelar) pressupõem a demonstração de "probabilidade do direito" e do "perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" (art.300, CPC).

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 300 – A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

- A tutela provisória de evidência (sempre satisfativa/antecipada) pressupõe a demonstração de que as afirmações de fato estejam comprovadas, tornando o direito evidente, o que se presume nas hipóteses do art. 311, CPC, examinado mais à frente.

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 311 - A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

- A urgência pode servir de fundamento à concessão da tutela provisória cautelar ou satisfativa (arts. 294, parágrafo único, e 300, CPC). A evidência, contudo, só autoriza a tutela provisória satisfativa'9 (ou simplesmente "tutela antecipada", metonímia legislativa) (arts. 294 e 311, CPC).

Novo CPC (LEI Nº 13.105/15)
[...]
Art. 294 - A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo único - A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

[...]

Art. 300 – A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

- Atenção: Para pedir uma tutela provisória satisfativa, é preciso alegar e demonstrar urgência (art.300, CPC) ou evidência (art. 311, CPC) - ou ambas, obviamente; mas a tutela provisória cautelar somente pode ser pleiteada em situações de urgência. Isso se dá porque a urgência é inerente à tutela cautelar.

- Se, ao pleitear a tutela provisória cautelar, além de urgência, estiver configurada uma das hipóteses descritas nos incisos do art.311 (tutela de evidência), tanto melhor para o requerente. O importante é que

1) não se pode pleitear tutela provisória cautelar com fundamento apenas no art.311, do CPC,

2) nem se pode exigir do requerente, em casos tais, que ele demonstre, além da urgência, a evidência do direito à cautela, isto é, uma das hipóteses do art.311, do CPC.

- É importante lembrar que evidência do direito à cautela não se confunde com probabilidade do direito acautelado. Esta última é um pressuposto para que a tutela cautelar (definitiva ou provisória) seja concedida, de modo que, para que seja deferida a tutela cautelar, é necessário aferir a probabilidade do direito acautelado. O que não se exige é que o requerente preencha uma das hipóteses descritas nos incisos do art.311, nem tampouco se permite que ele pleiteie a tutela provisória cautelar apenas com fundamento naquelas hipóteses normativas. Muito embora todas elas estejam sob a rubrica da tutela provisória, existem diferenças na forma como são requeridas.


REFERÊNCIAS

COSTA, Eduardo José da Fonseca. "Sentença cautelar, cognição e coisa julgada - reflexões em homenagem à memória de Ovídio Baptista". Revista de Processo. São Paulo: RT, 201 1, n. 191.

LACERDA, Galeno. Comentários ao Códi30 de Processo civil. 5ª ed. Rio de janeiro: Forense, 1993, V. 8, t. 1.

PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários a o Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, v. 10.


[1] O conteúdo textual da presente apostila foi retirado da obra DIDIER JR., Fredie; BRAGA; Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 10. ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015. v. 2. E também, todas as citações e notas, em sua íntegra.
[2] Interessante o pensamento de Roberto Campos Gouveia Filho e Mateus Costa Pereira que colocam o perigo da demora (pressuposto para a antecipação de tutela, seja de natureza satisfativa urgente, seja de natureza cautelar) como elemento (um dos) de suporte fático de fato jurídico processual, fato este que gera o dever (processual, pois conteúdo da relação jurídica-processual) para o Estado-juiz de antecipar a tutela ("Ação material e tutela cautelar", cit., p. 583-584).
[3] Na versão do Projeto do CPC de 2015 aprovada na Câmara de Deputados, o instituto fora denominado de "Tutela Antecipada", designação que nos parece tecnicamente mais adequada, que inclusive foi o título dado ao Livro V dedicado à matéria. Entretanto, quando o referido projeto voltou para o Senado, substituiu-se o termo "Tutela Antecipada" por "Tutela Provisória", reservando-se a expressão "Tutela Antecipada" exclusivamente para aquelas tutelas provisórias de caráter satisfativo. Não foi a opção mais adequada, como se verá, pois não há uma tutela antecipada definitiva, que se oporia à tutela antecipada provisória. Antecipar é técnica. Satisfazer tem a ver com o tipo de tutela. A tutela provisória é, isso sim, uma técnica processual de antecipação provisória dos efeitos finais da tutela definitiva, sendo esta última (a tutela definitiva) a única que goza da autonomia necessária para ser designada de "tutela", representando funções jurisdicionais próprias de certificação, a efetivação e o acautelamento do direito. E essa tutela antecipada tanto pode ser satisfativa como não satisfativa. Confirma essa visão o enunciado n. 25 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "Tutela antecipada é uma técnica de julgamento que serve para adiantar efeitos de qualquer tipo de provimento, de natureza cautelar ou satisfativa, de conhecimento ou executiva". Mas a terminologia legislativa não será desconsiderada nesse capítulo - nem poderia ser. Opta o legislador por falar em tutela provisória satisfativa (chamada de "antecipada") e não satisfativa (denominada "cautelar") e são esses termos que serão aqui utilizados.
[4] Na verdade, a simples improcedência do pedido de tutela definitiva é suficiente para que a tutela provisória perca sua eficácia. É o entendimento do enunciado n. 140 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "A decisão que julga improcedente o pedido final gera a perda de eficácia da tutela antecipada".
[5] Cf. ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de Tutela, 2ª ed., cit., p. 35-36.
[6] A tutela antecipada (provisória satisfativa) concedida e não questionada pode passar por um fenômeno de estabilização, previsto no art. 304, CPC. Essa estabilização da tutela antecipada não se confunde, contudo, com a coisa julgada, como se verá adiante.

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