Tema da aula: AÇÃO
CAUTELAR DE CAUÇÃO
1 – Conceito de
Caução
- Etimologicamente,
a palavra caução deriva do latim cautio,
que quer dizer prevenção ou precaução. Corresponde a uma medida tomada para se acautelar
contra um dano provável. Essa, em síntese, é a sua característica essencial.
- No
direito civil, mais especificamente, nos contratos, a caução ou garantia
corresponde a “todo negócio jurídico com
o objetivo de oferecer ao credor uma segurança de pagamento, além daquela genérica
situada no patrimônio do devedor”[1].
- Segundo
definição encontrada em doutrina, caucionar
é assegurar, garantir a realização futura do direito.
- A caução é a garantia do cumprimento de um dever ou de uma obrigação consistente em
colocar à disposição do juízo bens ou dando
fiador idôneo que assegure tal finalidade.
- A caução é a contracautela, ou seja, quando
houver a possibilidade de uma medida cautelar causar prejuízo, a garantia
contra esse prejuízo é feita mediante caução.
- A caução é a garantia do adimplemento da obrigação, consistente na apresentação
de bens suficientes em juízo, ou nomeação de fiador idôneo.
2 – Classificação
da caução
- A
caução, como visto, pode ser cautelar ou não-cautelar, sendo que
cada uma dessas modalidades pode ser explicada da seguinte forma:
I) A
caução cautelar – assim é entendida segundo em face do critério objetivo que realmente
perquerido e do procedimento a ser adotado, ou seja, se mero ato do
procedimento ou se necessário sua inclusão no bojo de uma ação cautelar;
II)
A caução não-cautelar – assim é entendida em face de sua origem no direito
material, ou seja, se tem origem em um contrato ou na lei ou na sentença. Pode
também ser classificada quanto ao objeto de sua prestação.
- A
caução não-cautelar descende diretamente de:
a) negócio
jurídico;
b) regra
de lei. Ex.: CPC - artigos 588, 690, 950, 1.051, 1.166 e 634, §§ 2º e 5º; ou
c) eficácia
de alguma sentença, proferida em processo de cognição, sendo que, nesta última
espécie, a vinculação no prestar a garantia mostra-se anterior ao próprio
processo em que é pedida.
3 – Traços
divisores na análise das cauções cautelares e não-cautelares
- Em
relação à caução não-cautelar, o juiz, quando chamado a se pronunciar,
encontra-se necessariamente vinculado, seja a um negócio jurídico anterior, seja
a eficácia de alguma sentença, ou a uma norma de direito material ou processual.
Em relação a esta categoria, cumpre ao juiz, respectivamente:
a) verificar
a existência, validade e eficácia do negócio jurídico;
b) dar
o exato cumprimento ao julgado; e
c) examinar,
ao aplicar a regra jurídica, se houve incidência de acordo com o suporte fático
nela contido.
- A
caução cautelar deriva do poder discricionário presente nesse tipo de tutela
jurídica e sua imposição dependerá dos pressupostos normais de qualquer ação ou
medida de segurança: fumus boni iuris
e periculum
in mora. Em outras palavras, pressupõe a motivação especial da tutela de
segurança.
4 – As cauções
cautelares – ação
cautelar inominada com imposição
de caução e medidas cautelares típicas
incidentais (contracauleta e cautela substitutiva)
- A
caução típica do processo cautelar pressupõe motivação especial da tutela de
segurança, ou seja, se faz necessário demonstrar a necessidade ou conveniência
da medida para realizar a função do processo cautelar, que é servir à útil e
eficiente atuação de outro processo.
- Atenção:
Só é possível a tutela cautelar típica quando se protege o interesse processual
(fumus boni iuris, ou direito de ação) em face do periculum in mora.
- Os
mestres Galeno Lacerda[2] e Ovídio
Batista[3] ensinam
que a caução, em todos os tipos de tutela cautelar, não passa de ato de
procedimento, necessariamente posterior à apreciação pelo juiz dos requisitos
do fumus boni iuris e do periculum in mora.
-
Segundo defende parte da doutrina, não há ação cautelar de caução, mas, apenas,
ação cautelar inominada, em que o juiz, segundo sua prudente discrição ou então
diante de expresso pedido da parte, considerando presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora e a adequação do
remédio jurídico ao caso concreto, impõe caução, como ato meramente
procedimental. Nessa linha de argumentação, a caução cautelar, visando a
preservação do status quo ante e a
efetividade de um processo principal, seria objeto de pedido em uma:
a) ação
cautelar inominada, que dela se serviria, constituindo simples ato do
procedimento;
b) Em
processos já em curso, cautelares ou não, assumindo a característica de medida
cautelar incidental, podendo consistir em:
I) Figura
integrante do poder geral de cautela
(art. 799);
II)
Medida substitutiva de outro provimento cautelar específico (art. 805);
III) Contracautela nas medidas liminares
(art. 804); ou
IV)
Qualquer outra medida que apresente natureza cautelar.
- Atenção:
Existem outras disposições no CPC que se enquadram como caução (com natureza
cautelar incidental da medida)
I)
O arresto (art. 816, II) e o sequestro (art.823) – quando servem de contracautela;
II)
O arresto (art. 819, II) e a nunciação de obra (art. 940 ) – quando servem de cautela
substitutiva.
- A
título de exemplo, o jurista Galeno Lacerda lista como espécies do gênero ação
cautelar inominada:
I) A
hipótese do art.529, do CCB (1916), ao estabelecer que “o proprietário ou
inquilino de um prédio, em que alguém tem o direito de fazer obras, pode, no
caso de dano iminente, exigir do autor delas as precisas seguranças contra o
prejuízo eventual”, em que a possibilidade de dano iminente poderia ser
prevenida pela caução;
II)
A hipótese do art. 1.280 (art.555, do CCB/1916) do novo Código Civil, referente
a cautio
damni infecti, no que é controvertido por Ovídio Baptista, que entende uma
vez prestada a caução pelo demandado, nenhuma ação principal deve ser proposta
pelo requerente.
“Código
Civil
(...)
Art. 1.280 - O proprietário ou o possuidor tem
direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste,
quando ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente.(...)”
- A
título de exemplo de caução requerida como medida incidental cautelar, em
processo que não tenha tal natureza, são os casos de execução provisória da
sentença, conforme autoriza o art.475-O (art. 588, inciso I) c/c art. 615, III,
do CPC.
- Atenção:
O mestre Galeno Lacerda defende a existência de uma terceira categoria de
caução cautelar denominando-a medida cautelar inexa a processo já em curso, da
qual é espécie a prevista no art. 925, do CPC, atuando a caução como contrapeso
à liminar de manutenção ou reintegração.
5 – Ação cautelar
de caução versus ação de caução pelo rito cautelar
- Atenção:
As ações de caução são ações híbridas, isto é, podem se apresentar como
verdadeiramente cautelares ou ações que, embora não o sendo, aproveitam o rito
cautelar, com as ressalvas já feitas. Disso resulta, justamente, a diferença
lógica entre a “ação cautelar de caução” e “ação de caução pelo rito cautelar”.
- A
“ação cautelar de caução” somente visa a obter uma garantia que será útil em um
outro processo que já está em curso ou será proposto.
- A
“ação de caução pelo rito cautelar” visa satisfazer o próprio direito da parte
requerente de ter garantia, mesmo que nada indique a fundada plausibilidade de
existir uma ação no presente ou no futuro. O direito à garantia, neste caso, decorre
da lei ou do contrato, não se indagando sobre a existência de futura ação.
6 – Fundamento jurídico da
Ação Cautelar de Caução
- A ação de
caução está prevista nos artigos 826 e seguintes do CPC pátrio, mais
especificamente, no Capítulo II, do Livro III, o qual foi destinado às ações de natureza cautelar. Daí resulta
a referência de que a caução está
definida pelo legislador como ação
cautelar específica.
- Atenção:
Segundo a doutrina, em regra, as pretensões de caução tem origem,
principalmente, em contratos (negócios), que ostentam justamente clara natureza
satisfativa, daí por que se pode afirmar que as pretensões de caução não têm
como ser compreendidas como pretensões verdadeiramente cautelares.
“Qualquer
que seja a natureza da pretensão de caucionar, o procedimento será o mesmo,
isto é, o dos arts. 830 a 834. Mas, é importante distinguir, nos casos
concretos, as ações de natureza cautelar, porque os seus efeitos são
diferentes, não obstante a identidade de rito. Basta lembrar que, sendo
principal a ação de caução, a sentença fará coisa julgada material, o que não
ocorre na medida cautelar, sempre passível de reexame, modificação ou
revogação. Além disso, sendo requerida em caráter preparatório, a ação cautelar
de caução obriga a propositura da ação principal em trinta dias, sob pena de
perda de eficácia, o que, obviamente, não se dá com a caução principal, em cujo
seguimento não há outra ação a ser proposta. Ocorrerá, outrossim, o dever de
reparar perdas e danos apenas perante a ação cautelar de caução, se se
verificar algumas das hipóteses previstas no art. 811.”
7 - Técnica de efetivação da caução
-
Segundo o art. 834, do Código de Processo Civil:
“julgando procedente o pedido, o juiz
determinará a caução e assinará o prazo em que deve ser prestada, cumprindo-se
as diligências que forem determinadas”.
- O
art. 834, do CPC prescreve a efetivação da substituição da vontade do requerido
de prestar a garantia. Hipótese que muito se aproxima ao procedimento do
arresto cautelar, previsto no art. 813, do CPC.
-
Explicando o procedimento da caução, caberia a mesma em não sendo viável a sub-rogação,
pelo fato de o patrimônio do requerido, por exemplo, ser móvel, estar em lugar
incerto e não ser possível fazer-se qualquer registro de gravame sobre ele.
Nestes casos, pode o magistrado aplicar meios coercitivos para forçar o
demandado a apresentar a garantia ordenada e, dentre os meios coercitivos
destacam-se não somente a aplicação de astreintes, mas também outros meios
alternativos, entre os quais, as medidas restritivas de direito.
- Na
hipótese de aplicação da medida de caução contra aquele que pleiteia tutela
jurisdicional (como por exemplo medida de urgência), vale dizer, em casos de
contracautela, afigura-se possível que o juiz, verificando que a parte
requerente tem condições de prestá-la, condicione o deferimento ou manutenção
da decisão a tal prestação. Explicando melhor, o autor deve apresentar caução,
se a decisão foi proferida em seu favor, por exemplo, se foi deferida
antecipação de tutela satisfativa ou de pretensão cautelar, quando estas serão
revogadas.
- Atenção:
A decisão que aplica astreintes, se condicionada a manutenção da decisão à
prestação de caução, somente mostra-se aceitável nos casos em que o autor pediu
a tutela jurisdicional e, em razão disso, lhe foi solicitada a contracautela.
Ademais, deve ser verificado se o autor tem reais condições de apresentar a
garantia. Isto por que a mera falta de condições financeiras ou patrimoniais,
não pode ser fator determinante e categórico a autorizar o indeferimento de
pretensões jurisdicionais, mormente de urgência.
- Atenção:
A técnica sub-rogatória diz respeito à superação da vontade do requerido pelo
próprio juiz. Vale dizer, independentemente do espírito volitivo e da
colaboração do demandado, o magistrado imporá a caução que recairá sobre bens escolhidos por ele mesmo (juiz).
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