Tema: DA FALÊNCIA
1 – Declaração da
falência em razão da ocorrência de circunstâncias indicativas de insolvência.
- As
circunstâncias indicativas de insolvência, constantes do art.94, inciso
III, da Lei nº 11.101/2005, também são denominadas de atos de falência.
“Art.94 - Será decretada a falência do devedor que:
(...)
III
– pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de
recuperação judicial:
a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou
lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos;
b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar,
com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou
alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não;
c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou
não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes
para solver seu passivo;
d) simula a transferência de seu principal
estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para
prejudicar credor;
e) dá ou reforça garantia a credor por dívida
contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes
para saldar seu passivo;
f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e
com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou
tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal
estabelecimento;
g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação
assumida no plano de recuperação judicial. (...)” (grifo nosso)
- Segundo Rubens Requião[1], circunstâncias
indicativas de insolvência se constituem em um Sistema de Enumeração Legal, ou seja, a lei indica fatos e
circunstâncias que, independentemente da impontualidade, caracterizam o
desequilíbrio econômico.
- A declaração
da falência em razão da ocorrência de circunstâncias
indicativas de insolvência independe
da existência de débito líquido, certo e exigível e de título vencido nem
de protesto. Esse entendimento é defendido por Manoel Justino Bezerra
Filho[2] quando argumenta:
“Da análise que
se faz das alíneas do inciso III, verifica-se que possibilidade de requerimento
de falência ser apresentado por credor, mesmo que o titulo representativo da
divida não esteja vencido. Um exemplo facilitará o entendimento: Imagine-se um
credor por promissória que irá se vencer apenas dentro de 90 dias,
credor este que verifica que o devedor está procedendo à liquidação precipitada
de seus bens ou lançando mão de meios ruinosos ou fraudulentos para realizar
pagamento (aliena a do inciso III do art. 94). Esse credor, valendo-se desta
disposição, poderá requerer a falência do devedor, mesmo que seu titulo não
esteja vencida e, obviamente, sem protestar seu título”
- A enumeração das circunstâncias indicativas de
insolvência é taxativa.
- Os atos de
falência enumerados na lei, se
fizerem parte do plano de recuperação judicial, não poderão servir de argumento para o credor pedir a falência do seu devedor.
2 – Estudo das circunstâncias
indicativas de insolvência
2.1 - Quando
o devedor procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio
ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos.
- No caso do devedor
proceder à liquidação precipitada de seus ativos o pedido de falência
descreverá os fatos que a caracterizam, juntando-se as provas que houver e
especificando-se as que serão produzidas.
“Art.94 - Será decretada a falência do devedor que:
(...)
III – Omissis.
(...)
§ 5o
- Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, o pedido de falência
descreverá os fatos que a caracterizam, juntando-se as provas que houver e
especificando-se as que serão produzidas.(...)”
- Atenção: Entende a doutrina que o
legislador, no tocante as hipóteses da alíneas “a” a “g”,
do inciso III, do art.94, da Lei nº 11.101/05, cometeu um deslize, vez que tais
hipóteses não podem fazer parte do plano
de recuperação judicial. Isto porque tais situações se constituem “atos
ruinosos e fraudulentos”, “atos simulados”, “abandono
de estabelecimento”, ou, ainda, o próprio descumprimento do plano de
recuperação.
- Atenção: A questão da liquidação precipitada está relacionada
à liquidação do ativo permanente.
Afinal, a lógica de tal procedimento (liquidação) significa que o devedor
pretende esquivar-se ao pagamento dos credores.
- Atenção: Fazem parte do ativo
permanente os imóveis ou maquinários necessários ao exercício da atividade do empresário.
2.2 –
Quando o devedor realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o fito
de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado, ou alienação de
parte ou da totalidade do seu ativo a terceiro, credor ou não.
- Quando o devedor
realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o fito de retardar
pagamentos ou fraudar credores, se faz necessário entender que, basta a simples tentativa de simulação para
que a falência fique caracterizada.
2.3 –
Quando o devedor transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o
consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver
seu passivo.
- Acerca do estabelecimento da empresa disciplina o
art.1.142, do Código Civil de 2002:
“Art.1.142 - Considera-se estabelecimento todo complexo
de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade
empresária”.
- Atenção: A definição legal de
estabelecimento engloba não só os bens materiais, mas também os imateriais.
- Atenção: No art.1.142, do Código Civil
de 2002 a expressão bens materiais,
no tocante a estabelecimento da empresa, está relacionada ao imóvel, ao
estoque, ao maquinário.
- Atenção: No art.1.142, do Código Civil
de 2002 a expressão bens imateriais,
no tocante a estabelecimento da empresa, está relacionada ao ponto, ao
aviamento, marca, patente.
- Atenção: O imóvel é apenas um dos elementos que compõem o estabelecimento.
- Com relação à transferência do fundo de comércio, segundo
a LRF, o importante é proteger este ativo do devedor, que é uma das maiores
garantias dos credores.
- A transferência
fraudulenta do estabelecimento da
empresa, além de justificar a falência, é ainda causa para a propositura da ação revocatória, a qual
se encontra prevista no inciso VI, do art. 129, da LRF.
“Art.129 - São ineficazes em relação à massa falida,
tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira
do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores:
(...)
III – a constituição de direito real de garantia, inclusive
a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída
anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores,
a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada;
(...)
VI – a venda ou transferência de estabelecimento feita
sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo
existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu
passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos
credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do
registro de títulos e documentos; (...)”
2.4 –
Quando o devedor simula a transferência de seu principal estabelecimento com o
objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor.
- Manoel Justino
Bezerra Filho[3], acerca
da simulação da transferência do
principal estabelecimento do devedor, com o objetivo de burlar a legislação,
diz que:
“Nos dias de hoje, é muito comum
que o principal estabelecimento seja meramente de natureza administrativa, de
tal forma que as principais unidades produtivas estejam situadas em
estabelecimentos espalhados por extensão territorial diversa. Também aqui o
entendimento deve ser no sentido de que, mesmo que o estabelecimento não seja
o principal, ainda assim se a transferência de “qualquer estabelecimento”
for simulada, como intuito de burlar a legislação ou a fiscalização ou com o
intuito de prejudicar credores,estará se caracterizando também ato de falência”.
2.5 –
Quando o devedor dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída
anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para
saldar seu passivo.
- Segundo a LRF, o devedor está proibido de dar ou de reforçar
garantia a credor, em relação à dívida anteriormente contraída, quando tal
situação o deixe sem bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu
passivo
- Atenção:
A lei não proíbe que o devedor aliene ou
onere seus bens. Esta hipótese, também prevista no art. 129, III, da LRF está relacionada
à garantia de dívida já existente, de
modo que se verifique uma melhora na situação do credor, que tenha sido
constituído antes da constituição da nova garantia.
- Atenção:
Em caso do devedor empresário assumir nova dívida,
com a constituição de garantia real,
não será nem caso de decretação da falência, nem de ação revocatória.
- A respeito do devedor empresário que assume nova dívida,
com a constituição de garantia real
ensinava o saudoso professor Rubens Requião[4]:
“É claro que as operações bancárias, geralmente garantidas com penhor, hipoteca
ou alienação fiduciária em garantia, escapam a suspeita legal.Trata-se, na
aliena indicada, de créditos antigos, composição ou recomposição de dívidas
difíceis de liquidar, dada a situação econômico-financeira da empresa. A
composição dessas dívidas, ocasião em que se constitui a garantia real a favor
de um ou alguns credores em detrimento dos demais, configura-se a hipótese da
alínea, pois do patrimônio se subtraem os bens que constituem a garantia
igualitária dos credores. A hipótese é de fácil ocorrência, sendo
constantemente conhecida nos tribunais. (...)”
2.6 –
Quando o devedor se ausenta sem deixar representante habilitado e com recursos
suficientes para pagar os credores, ou abandona o estabelecimento ou tenta
ocultar-se de seu domicilio, do local de sua sede ou de seu principal
estabelecimento.
- Se constitui em ato
de falência o devedor se ausentar sem deixar representante habilitado e com
recursos suficientes para pagar os credores, ou também abandonar o
estabelecimento, sem justo motivo.
- Atenção:
A prova de ocultação do
devedor empresário tem sido admitida até por certidão do oficial de justiça.
- Ricardo Negrão[5] leciona
que a demonstração da ausência do devedor, sem ter deixado ele representante
habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, pode ser
realizada de muitas maneiras, tais como:
I - A devolução de correspondência, por não ter sido
encontrado o destinatário em seu estabelecimento empresarial ou por estar
fechado em horários comerciais;
II - A tentativa de citação por oficial de justiça, em
outro processo devidamente certificada.
III - Divulgação pela imprensa falada ou escrita, do
abandono ou fuga do empresário ou dos administradores da sociedade empresarial.
IV - Impossibilidade de acesso, por ausência do
empresário ou dos administradores habilitados, à fiscalização do Poder Público,
certificada pelo funcionário competente.
V - A devolução de títulos para aceite ou pagamento ao
cartório de protestos, por ausência de pessoa credenciada a recebê-los.
VI - Acúmulo de correspondência, jornais e boletos de
cobrança à porta do estabelecimento, relevando o estado de abandono.
VII - Não comunicação ao órgão de registro de empresa
(Junta Comercial) da mudança de seu estabelecimento.
VIII - Reiterada devolução de correspondência eletrônica.
2.7 –
Quando o devedor deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no
plano de recuperação judicial.
- É também um ato de
falência o devedor deixar de cumprir,
no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial.
- A situação do
devedor deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de
recuperação judicial se aplica a qualquer um dos três tipos de declaração
de falência (requerimentos), constantes dos incisos I, II e III do art. 94,
da LRF.
- Atenção: O pedido de recuperação judicial impede
a decretação da falência, consoante
se infere do disposto no inciso VII, do art.96, da LRF.
“Art.96 - A falência requerida com base no art. 94,
inciso I do caput, desta Lei, não será decretada se o requerido provar:
(...)
VII – apresentação de pedido de recuperação judicial no
prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51 desta Lei; (...)”
Referências
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reorganização e a recuperação das empresas em crise: fundamentos edificantes da
reforma falimentar. Disponível em: http://www.saoluis.br/revistajuridica/arquivos/004.pdf
BONAVIDES, Paulo. Curso de
Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
CASTRO, Carlos Alberto
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COELHO, Fábio Ulhoa. Curso
de direito comercial, v.3., São Paulo: Saraiva, 2005.
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual
de Direito Comercial. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
______. Comentários à nova lei de
falências e de recuperação de empresas. 5. ed. rev. São Paulo: Saraiva,
2008.
COELHO, Fabio Ulhoa.
Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 6.ª edição.
Editora Saraiva. 2009.
COMPARATO, Fábio Konder.
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DINIZ, Fernanda Paula. A
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MAMEDE, Gladston. Falência
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PAES DE
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Amador. Curso de Falência e Recuperação de Empresa, 25ª Edição. São Paulo:
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PAIVA, Luis Fernando
Valente de (Coord). Direito Falimentar e a nova lei de Falências e Recuperação
de Empresas, SP: Quartier Latin, 2005.
SCALZILLI, João Pedro; TELLECHEA, Rodrigo; SPINELLI, Luis Felipe. Objetivos e
Princípios da Lei de Falências e Recuperação de Empresas. http://www.sintese.com/doutrina_integra.asp?id=1229
[1] REQUIÃO, Rubens – Curso de Direito
Falimentar - vols. 1 e 2 17ª ed.Saraiva – 1998.
[2] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova
Lei de Recuperação e Falências comentada. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 3a. ed. 2005 p. 237.
[3] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova
Lei de Recuperação e Falências comentada. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 3a. ed. 2005 p. 239.
[4] REQUIÃO, Rubens – Curso de Direito
Falimentar - vols. 1 e 2 17ª ed.Saraiva – 1998.
[5] NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito
comercial e de empresa. Volume 3/Ricardo Negrão, 5ª. ed. rev. e atual. – São
Paulo: Saraiva, 2007, p.104.
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