AULA
Tema: AÇÃO
CAUTELAR DE ANTECIPAÇÃO DE PROVAS[1]
1 – A medida
cautelar de antecipação de prova
- Segundo
Carlos Alberto Álvaro Oliveira[2] e
Galeno Lacerda, em algumas situações é necessário colher os fatos relevantes
antes da propositura da ação declaratória de direito, em razão do risco da
impossibilidade de produzir as provas posteriormente, como, por exemplo, a
inquirição de testemunha gravemente enferma ou perícia em prédio que está na
iminência de ser demolido. E nesses casos, a prova pode ser produzida antes da
fase de instrução ou em sede de medida cautelar de produção antecipada de
provas antecedente à demanda principal.
- Atenção:
Ensina Cassio Scarpinella Bueno[3]
que, não obstante a ação cautelar seja chamada de produção antecipada de prova,
não há produção no sentido técnico, já que a sua finalidade é apenas colher os
fatos em juízo e a admissão, produção e valoração da prova são feitas somente
no processo principal. Ademais, é possível que os fatos colhidos na ação
cautelar não sejam sequer admitidos como prova no processo principal.
1.1 – Requisitos
da ação cautelar de antecipação de prova
- Carlos
Alberto Álvaro Oliveira[4]
lembra que os requisitos para propositura de ação cautelar são o fumus boni iuris e periculum in mora, mas, adverte que, na produção antecipada de
prova o segundo requisito tem maior importância, pois tanto o autor como o réu
têm interesse jurídico na colheita antecipada da prova para usá-la futuramente
com a finalidade de formar o convencimento do juízo.
- É
a própria legislação que dá maior ênfase ao periculum
in mora, consoante se verifica do disposto no art.847, do Código de
Processo Civil, ao admitir:
I) A
prestação de depoimento da parte e inquirição de testemunhas antes da
audiência de instrução e julgamento quando tiverem que se ausentar; ou
II)
Se, por motivo de idade ou de moléstia grave, houver justo receio de que
ao tempo da prova já exista, ou esteja impossibilitada de depor.
- Atenção:
O exame pericial pode ser realizado antecipadamente, caso haja “fundado receio de que venha a tornar-se
impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação”
(art.849, CPC). Além disso, exige-se que na inicial o autor apenas justifique sumariamente
a necessidade da antecipação (art. 848, CPC).
- Humberto
Theodoro Júnior[5]
afirma ainda que o periculum in mora
pode ser interpretado como impossibilidade fática e jurídica de colher a prova
posteriormente. O primeiro caso se configura nas situações de urgência
exemplificadas acima e a jurídica ocorreria quando a parte precisasse de
determinada prova para propor a demanda principal como, por exemplo, a ação
indenizatória decorrente da má execução da obra em que fosse necessário
realizar antecipação da prova pericial para apurar os fatos e até mesmo
viabilizar a negociação entre os litigantes.
- Atenção:
A doutrina majoritária discorda do entendimento de Humberto Theodoro Júnior, vez
que defende o cabimento da produção antecipada às hipóteses de urgência fática[6] em
razão da própria previsão legal e por interpretar a “impossibilidade jurídica”
como pertinente à causa petendi da demanda principal[7].
- Atenção:
Partindo-se da ideia de que o fumus boni
iuris tem relevância mínima, ou até mesmo dispensável segundo parte da
doutrina, entende-se que não é sequer necessário indicar a lide principal e seu
fundamento como nas demais ações cautelares (art. 801, III, CPC), mas somente
apontar “com precisão os fatos sobre que há de recair a prova” (art. 848,
CPC)17.
1.2 –
Legitimidade ativa
-
Considerando a utilidade da prova para ambas as partes na futura demanda de
mérito, a medida cautelar de produção antecipada de prova pode ser requerida
pelo autor ou réu e até mesmo por terceiros juridicamente interessados, como,
por exemplo, o responsável por via de regresso, já que pode ingressar na
demanda principal por meio da denunciação da lide.
- Atenção:
A legitimidade está sempre relacionada com o interesse jurídico relativo a uma
determina relação jurídica material.
- Atenção:
A ação cautelar de produção antecipada de prova é admissível que os eventuais
terceiros da ação principal integrem a ação cautelar de produção antecipada de
prova. Todavia, exclui-se de plano a oposição porque não há bem da vida a ser
atribuído ao autor da ação cautelar e se admite a nomeação à autoria, já que o
réu na própria cautelar pode indicar o legitimado a integrar o polo passivo da
demanda.
- O
chamamento ao processo[8] e
a denunciação da lide[9],
por sua vez, têm a finalidade de vincular o terceiro responsável ao resultado
do processo para que no caso de eventual condenação possa dele obter o
ressarcimento na mesma lide.
- Atenção:
Carlos Alberto Álvaro Oliveira[10]
leciona que O ingresso do terceiro só pode ser admitido quando a sua citação “não determine impossibilidade na colheita
emergencial da prova, causando dano irreparável ao requerente originário da
medida”.
1.3 – Provas que
podem ser antecipadas
- Segundo
dispõe o art. 846, do Código de Processo Civil, podem ser antecipados:
a)
O interrogatório da parte;
b)
A inquirição de testemunhas; e
c)
O exame pericial.
- O
interrogatório da parte segue o procedimento do depoimento pessoal previsto nos
artigos 343 a 347, do CPC, salvo a pena de confissão na hipótese de omissão
(art. 343, § 2°, CPC), tendo em vista que se destina somente a documentar os
fatos perante o juiz[11].
- Atenção:
A ausência ou recusa de responder determinadas perguntas (art. 345, CPC), quando
do interrogatório da parte, ficarão documentadas e poderão ser valoradas de
forma negativa pelo juiz da demanda principal, devendo inclusive constar no
mandado de citação que a “ausência ou
recusa em depor constituirá atitude a ser sopesada de forma desfavorável no
eventual processo principal”[12].
- A
inquirição de testemunha segue o procedimento previsto nos artigos 407 a 419,
do Código de Processo Civil, com as devidas adequações, quais sejam:
I) Não
é necessário depositar rol de testemunhas (art.407, caput, CPC), já que deve
constar no processo principal;
II)
Não são cabíveis as hipóteses de substituição previstas no art. 408, do CPC;
III)
Exclui-se a aplicação do art.410, inciso I, do mesmo CPC, porque a inquirição
já é antecipada;
IV)
Não se pode contraditar o depoimento (art. 414, § 1°, CPC), requerer a
inquirição de outras testemunhas mencionadas no depoimento ou realizar
acareação (art. 418, CPC), porque a valoração das provas somente pode ser feita
na ação principal[13].
- O
exame pericial abrange o exame, a vistoria, avaliação e o arbitramento.
- O
exame pericial consiste na inspeção feita pelo perito para averiguar a
existência de determinado fato ou circunstância em coisa móvel, semovente,
livros comerciais, documentos em geral e até mesmo em pessoas.
- A
vistoria é a perícia feita em bem imóvel.
- A
avaliação visa averiguar o valor em dinheiro de determinada coisa ou obrigação
e o arbitramento busca estimar o valor de um serviço ou cálculo abstrato de
indenização[14].
- Atenção:
O exame stricto senso e a vistoria podem ser feitos antecipadamente, se houver
risco de perecimento da coisa móvel ou imóvel. Contudo, Porém, não parece adequada
a realização antecipada da avaliação e o arbitramento em sede de cautelar
porque a apreciação econômica pode ser feita posteriormente[15].
- O
procedimento do exame pericial deve observar os artigos 420 a 439 do CPC (art.
850), mas com as necessárias adaptações, que são as seguintes:
1ª)
Não se admite a realização antecipada de vistoria e arbitramento, em razão da
ausência de urgência.
2ª)
O prazo para realização da prova pericial deve ser fixado de acordo com o caso
concreto, não sendo necessário observar o disposto no art. 433, caput, do
Código de Processo Civil.
3ª)
Embora seja vedada a valoração da prova na ação cautelar, é possível requerer
esclarecimento do perito e do assistente técnico (art. 435, CPC) para apuração
mais precisa, atendendo a finalidade da produção antecipada[16].
Note-se que essa hipótese diverge da contradita da testemunha (art. 414, § 1°,
CPC) e da acareação (art. 418, II, CPC) porque em ambas o objetivo é confrontar
o depoimento com a finalidade de convencer o juízo da tese alegada pela parte,
enquanto na prova pericial o escopo é apenas esclarecer algum aspecto do laudo.
1.4 – Sentença
- A
sentença na ação cautelar de produção antecipada tem natureza homologatória,
devendo somente atestar a regularidade da colheita[17].
- A
sentença na ação cautelar de produção antecipada perde sua eficácia se não for
proposta a demanda principal no prazo de trinta dias[18],
já que sua finalidade é apenas homologar os fatos documentados.
- A
autonomia da sentença na ação cautelar de produção antecipada é confirmada pelo
próprio art.851, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que os autos
permanecem em cartório, podendo as partes requerer certidão dos fatos colhidos
independentemente da propositura da demanda principal.
Referências
BEDAQUE, José
Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual, 3ª ed. São
Paulo: Malheiros, 2010.
BUENO, Cassio
Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: tutela antecipada,
tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos, vol. 4. São Paulo:
Saraiva, 2009.
CARNELUTTI,
Francesco. La prueba civil, 2ª ed. Trad. Giacomo P. Augenti. Buenos Aires:
Depalma, 2000.
CINTRA, Antonio
Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
geral do processo, 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
DINAMARCO,
Cândido Rangel. Instituições de Direito
Processual Civil, III, 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
_____.
Intervenção de terceiros, 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
MARINONI, Luiz
Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
NEVES, Daniel
Amorim Assumpção. Ações Probatórias Autônomas. Tese de doutorado. 2006. 442 p.
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.
OLIVEIRA, Carlos
Alberto Álvaro; LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei
n° 5.869 de 11 de janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de
Janeiro: Forense, 2007.
SILVA, Ovídio A.
Baptista. Do processo cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
THEODORO JUNIOR,
Humberto. Processo cautelar, 24ª ed. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de
Direito, 2008.
YARSHELL, Flávio
Luiz. Antecipação da prova sem o requisito da urgência e direito autônomo à
prova. Tese de titularidade. 2008. 468 p. Tese (Professor Titular de Direito
Processual Civil) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2008.
[1] O conteúdo textual da aula foi extraído de ALMEIDA, Úrsula Ribeiro de. Produção
antecipada da prova sem urgência no direito ambiental: risco de dano ao meio
ambiente. Disponível em http://www.esmp.sp.gov.br/revista_esmp/index.php/RJESMPSP/issue/view/4/showToc. Acesso em 2 mar
2015.
[2] OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro,
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 237-238.
[3] BUENO, Cassio Scarpinella. Curso
sistematizado de direito processual civil: tutela antecipada, tutela cautelar,
procedimentos cautelares específicos, vol. 4. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 281.
[5] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo
cautelar, 24ª ed. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de Direito, 2008, p.
333-334.
[6] No mesmo sentido: BUENO, Cassio
Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: tutela
antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos, vol. 4. São
Paulo: Saraiva, 2009, p. 284.
[7] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro,
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 239.
[8] No chamamento ao processo o réu em
demanda condenatória o réu chama o devedor solidariamente responsável para
integrar a relação processual na qualidade de litisconsorte passivo, para que a
eventual condenação tenha igual eficácia sobre ele (art. 78, CPC). O autor pode
requer o pagamento do réu e do terceiro e o réu, por sua vez, pode exercer seu
direito de regresso no mesmo processo se pagar a condenação em sua integralidade
(art. 80, CPC).
[9] A denunciação da lide, por sua vez, é
o mecanismo pelo qual o autor e o réu provocam a participação daquele que tem o
dever de ressarci-lo em caso de eventual condenação. O litisdenunciado integra
a lide na qualidade de assistente litisconsorcial
(arts. 74 e 75, I, do CPC).
[10] OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 243.
[12] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 248.
[13] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 249.
[14] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 244.
[16] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 258.
[18] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro;
LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil: Lei n° 5.869 de 11 de
janeiro de 1973, vol. VIII (arts. 813 a 889), tomo II. Rio de Janeiro: Forense,
2007, p. 258.
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