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AULA DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema da aula: A COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS (Cont.)

2 – COISA JULGADA ERGA OMNES OU ULTRA PARTES

- A coisa julgada nas ações coletivas vem disciplinada nos artigos 103 e 104, do Código de Defesa do Consumidor.

- A coisa julgada ser erga omnes ou ultra partes, conforme seja a ação fundada em direito ou interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo.

- Em se tratando de interesse ou direito difuso (inciso I, do parágrafo único do art. 81), sendo promovida ação coletiva por um dos legitimados do art. 82 (ou por mais de um em litisconsórcio), a coisa julgada será erga omnes, salvo se o pedido deduzido em juízo for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova (inciso I do art. 103).

- Se o interesse ou direito for coletivo stricto sensu (inciso II, do parágrafo único do art.81), formar-se-á coisa julgada ultra partes para o grupo, categoria ou classe, salvo se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, caso em que, assim como na hipótese anterior, poderá qualquer legitimado propor nova ação, desde que com nova prova (inciso II, do art. 103).

- Nas duas hipóteses, acima mencionadas, de acordo com o § 1º do art. 103 do CDC, os efeitos da coisa julgada "não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe”, ou seja, não ficarão impedidos os indivíduos de promover as respectivas ações individuais, com o fito de obter o reconhecimento do seu direito individual.

- Se o direito for individual homogêneo (inciso III, do parágrafo único, do art. 81), a coisa julgada será erga omnes, no caso de procedência do pedido (art. 103, III, do CDC).

- Na prática, pode ocorrer três hipóteses:

1º) A vítima ou seu sucessor poderá promover liquidação e/ou execução fundada na sentença de procedência, não sendo necessário o ajuizamento de ação condenatória.

2º) Se a sentença prolatada for improcedente, a vítima poderá ajuizar uma ação individual condenatória, desde que não tenha ingressado no processo coletivo como litisconsorte ou assistente litisconsorcial (art. 103, §2º, do CDC).

3º) Se o processo for julgado extinto, sem resolução do mérito, a sentença produzirá apenas coisa julgada formal, não impossibilitando a propositura de nova ação coletiva (art. 268, do CPC). 

- Contata-se que o raciocínio do legislador infraconstitucional foi diferente no caso do direito individual homogêneo, em relação aos direitos essencialmente coletivos (difusos e coletivos stricto sensu), ou seja, estes só podem ser tutelados por meio da ação coletiva, enquanto aqueles, por serem na essência individuais, podem perfeitamente ser protegidos via ação individual[1].

- Ex.: Um pacote de biscoito Nestlé sofre diminuição de 25 gramas, sem a ostensiva informação ao consumidor. Por conseguinte, cada consumidor pode promover ação individual para ser ressarcido, tendo em vista o direito do consumidor à informação sobre a mudança da quantidade do produto. Obviamente, pouquíssimos consumidores promoverão ações judiciais individuais com esse objetivo. Desse modo, inviabilizada a ação coletiva, pode-se concluir pela violação ao princípio do acesso à justiça.

- Patricia Miranda Pizzol[2] leciona que o CDC, ao conceder a qualquer legitimado a faculdade de propor uma nova ação, não exclui o próprio autor da demanda, cujo pedido foi julgado improcedente por insuficiência de provas, pois, se assim o desejasse, teria dito "qualquer outro legitimado” e não simplesmente "qualquer legitimado”[3].

- A expressão "segundo o evento da lide" (secundum eventum litis), significa que, dependendo do resultado do processo, poderá a sentença fazer coisa julgada erga omnes ou ultra partes (conforme a categoria de direito coletivo em que se fundou a ação), ou não fazer coisa julgada. 

- Na prática: 

1) Se o pedido do autor for acolhido, todos os titulares do direito material (mesmo aqueles que não participaram do processo) serão atingidos pela sentença.

2) Se o pedido do autor for julgado improcedente, em virtude de insuficiência de provas, não se produzirá a coisa julgada com relação aos legitimados, que poderão propor nova ação, com mesmo fundamento, desde que baseada em nova prova[4].

3) Se a ação for julgada improcedente por outro motivo diverso da insuficiência de provas, formar-se-á a coisa julgada, não sendo possível a propositura de outra ação coletiva.

4) Se o processo extinto sem julgamento de mérito, por um dos fundamentos do artigo 267, do CPC, a sentença fará apenas coisa julgada formal, não restando inviabilizada a propositura de nova ação coletiva.

- Patricia Miranda Pizzol lembra que as expressões erga omnes e ultra partes são distintas, pois, servem para designar os efeitos da coisa julgada nas hipóteses de direitos difusos e coletivos stricto sensu, respectivamente. Assim ocorre, vez que, quando a coisa julgada é ultra partes a mesma atinge todos os integrantes de uma determinada categoria, classe ou grupo (os titulares do interesse coletivo tutelado são determináveis), enquanto que a coisa julgada erga omnes produz efeitos em relação a toda coletividade (titulares indeterminados). 

- Na verdade, em termos práticos, a sentença atingirá todos os titulares do direito ou interesse: 

a) no caso dos interesses difusos, tais titulares sequer podem ser identificados, logo, toda a coletividade (todos) é alcançada pela coisa julgada;

b) em se tratando de direito coletivo stricto sensu, os titulares são identificáveis, porque pertencem a um grupo, classe ou categoria (a expressão ultra partes se justifica porque parte é aquele que figura na relação jurídica processual; caso se admita a existência de parte material, também nesse caso a coisa julgada operar-se-á contra todos os integrantes da classe, grupo ou categoria);

c) em se tratando de interesse individual homogêneo, embora os seus titulares sejam perfeitamente individualizáveis, somente por ocasião da liquidação ou da execução é que a individualização se dará; desse modo se justifica falar em coisa julgada erga omnes.

- Como se vê, "o regime da coisa julgada oferece peculiaridades nas ações coletivas", vez que "a própria configuração das ações ideológicas - em que o bem a ser tutelado pertence a uma coletividade de pessoas - exige, pelo menos até certo ponto, a extensão da coisa julgada ultra partes; mas, de outro lado, a limitação da coisa julgada ‘às partes’ é princípio inerente ao contraditório e à defesa, na medida em que o terceiro, juridicamente prejudicado, deve poder opor-se à sentença desfavorável proferida inter alios, exatamente porque não participou da relação jurídico-processual”[5].

Bibliografia

PIZZOL, Patricia Miranda. Coisa julgada nas ações coletivas. http://www.pucsp.br/tutelacoletiva/download/artigo_patricia.pdf

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 47. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v.1.





[1] Patricia Miranda Pizzol anota “Isto assim é porque nas duas primeiras hipóteses inexiste colaboração possível, ou, ao menos o ‘convite’ para que os interessados, propriamente ditos, possam atuar. Conseqüentemente, é possível e plausível que venha a surgir nova prova, porque a cognição dos legitimados do art. 82 é ou pode ser, por certo, compreensivelmente limitada, pela circunstancia de maior distanciamento dos fatos e, pois, das possíveis provas a esses referentes” (Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, Código do consumidor comentado, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 468).


[2] PIZZOL, Patricia Miranda. Coisa julgada nas ações coletivas. http://www.pucsp.br/tutelacoletiva/download/artigo_patricia.pdf


[3] Ada Pellegrini Grinover, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, cit., p. 588-589; José Carlos Barbosa Moreira, A ação popular do direito brasileiro como instrumento de tutela jurisdicional dos chamados "interesses difusos". In: Temas de direito processual. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 110-123; Rodolfo de Camargo Mancuso, Manual do consumidor em juízo, 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 157; Vidal Serrano Nunes Júnior e Yolanda Alves Pinto Serrano, Código de defesa do consumidor interpretado, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 253; Pedro Lenza, Teoria geral da ação civil pública, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 239; Marcelo Abelha, Ação civil pública e meio ambiente, 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 255; Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, Código do consumidor comentado, cit., p. 464.


[4] Patricia Miranda Pizzol anota que, no sentido da inocorrência de coisa julgada, se manifesta Ada Pellegrini Grinover, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto , cit., p. 932; Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, Código do consumidor comentado, cit., p. 464, nota 11. Para Nelson

Nery Junior, pode-se falar em espécie de relativização da coisa julgada (Teoria geral dos recursos, 6. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 522).


[5] Ob. Cit.

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