1 – Da
caracterização e declaração da falência.
- No direito brasileiro, a
falência só pode caracterizar-se por três formas:
1ª) Pela impontualidade no pagamento de dívida líquida, certa e exigível
(art.94, I, da LRF).
2ª) Pela inexistência de bens suficientes para garantir execução de quantia
liquida (art.94, II, da LRF).
3ª) Pela ocorrência de circunstâncias indicativas de insolvência (art. 94,
III da LRF).
“Para se decretar a falência da sociedade
empresária, é irrelevante a “insolvência econômica”, caracterizada pela
insuficiência do ativo para a solvência do passivo. Exige alei a “insolvência
jurídica”, que se caracteriza, no direito falimentar brasileiro, pela
impontualidade injustificada (LF art. 94, I), pela execução frustrada (art. 94,
II) ou pela prática de atos de falência (art.94, III)”
“Lei
nº 11.101/05
(...)
Art.94 - Será
decretada a falência do devedor que:
I – sem
relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida
materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse
o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência;
II –
executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à
penhora bens suficientes dentro do prazo legal;
III –
pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de
recuperação judicial: (...)”
2 - Declaração
da falência em razão de impontualidade
injustificada
“Lei
nº 11.101/05
(...)
Art.94 - Será
decretada a falência do devedor que:
I – sem
relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida
materializada em título ou títulos executivos cuja soma ultrapasse o
equivalente a 40(quarenta) salários mínimos na data do pedido de falência. (...)”
2.1 – Observações
sobre o pedido de falência:
“O pedido de falência apenas é possível se o
valor do título executivo ultrapassa o correspondente a quarenta salários
mínimos, o que é medida salutar, pois evita o aviltamento do instituto da falência,
que passou a ser utilizado como simples ação de cobrança, havendo casos de
requerimento de falência nos quais o valor era inferior a um salário mínimo. Atendeu a nova lei ao clamor que já se
fazia sentir, especialmente na primeira instância do judiciário, que vinha
negando seguimento a requerimentos de
falência, de valor insignificante, sob diversos argumentos, especialmente de
que a grandeza do instituto falimentar não se prestava a permitir seu
acionamento para valores insignificantes, o que, aliás, encontraria também
respaldo na preservação do Judiciário para que possa operar em causa de
verdadeiro interesse para a sociedade, entendimento consagrado no brocardo de
minimus nom curat praetor”. (grifo nosso)
“A impontualidade injustificada
característica da falência deve referir-se a obrigação líquida, entendendo-se
assim a representada por título executivo judicial ou extrajudicial protestado”
- Atenção: Os títulos executivos estão divididos em duas categorias:
1ª) Títulos executivos judiciais - são os títulos que se encontram relacionados
no art.475-N, do CPC, ou seja, a sentença
condenatória proferida em processo civil;
b) Títulos executivos extrajudiciais - são os títulos que se encontram
relacionados no art.585, do CPC.
I - a sentença proferida no processo civil que
reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou
pagar quantia;
II - a sentença penal condenatória transitada em
julgado;
III - a sentença homologatória de conciliação ou de
transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo;
IV - a sentença arbitral;
V - o acordo extrajudicial, de qualquer natureza,
homologado judicialmente;
VI - a sentença estrangeira, homologada pelo
Superior Tribunal de Justiça;
VII - o formal e a certidão de partilha, exclusivamente
em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular
ou universal.
Art. 585 - São títulos
executivos extrajudiciais: (Alterado pela Lei nº 5.925/1973)
I - a letra de
câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque; (Alterado
pela Lei nº 8.953/1994)
II - a escritura pública ou outro documento
público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor
e por duas testemunhas; o instrumento
de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou
pelos advogados dos transatores; (Alterado pela Lei nº 8.953/1994)
III - os
contratos garantidos por hipoteca,
penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida; (Alterado pela Lei nº 11.382/2006)
V - o crédito, documentalmente comprovado,
decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como
taxas e despesas de condomínio; (Alterado pela Lei nº 11.382/2006)
VI - o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de
tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por
decisão judicial; (Alterado pela Lei nº 11.382/2006)
VII - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública
da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios,
correspondente aos créditos inscritos na forma da lei; (Alterado pela Lei nº 11.382/2006)
VIII - todos os demais
títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva. (Alterado pela Lei nº 11.382/2006) (...)”
2.2 –
Observação acerca dos títulos de crédito por renda ou aluguel de imóvel e o
encargo de condomínio
- Atenção: É fato que o CPC elencou o crédito por renda ou aluguel de imóvel e o encargo de condomínio, entre
os títulos executivos extrajudiciais.
Todavia, mencionados títulos não são
constituídos de liquidez, necessitando
sempre de procedimento de cálculo para apuração do quantum devido. E por esta
razão, tais títulos não são hábeis para
embasar requerimento de falência.
2.3 –
Observações sobre a instrução do pedido de falência
- Segundo o § 3º, do art.94, da Lei
nº 11.101/05, o pedido de falência será
instruído com títulos executivos exibidos no original ou por cópias
autenticadas se estiverem juntados em outro processo, acompanhados em
qualquer caso dos respectivos instrumentos de protestos “para fim
falimentar nos termos da legislação específica”.
“Lei
nº 11.101/05
(...)
Art.94 - Será
decretada a falência do devedor que:
(...)
§ 3o
- Na hipótese do inciso I do caput deste artigo, o pedido de falência
será instruído com os títulos executivos na forma do parágrafo único do art. 9o
desta Lei, acompanhados, em qualquer caso, dos respectivos instrumentos de
protesto para fim falimentar nos termos da legislação específica. (...)”
2.4 –
Observações sobre a caracterização da impontualidade
- A impontualidade se caracteriza
pelo protesto do título, segundo o Capítulo I, da Lei nº 9.492/97[4] (regulamento), in verbis:
“Capítulo I - Da Competência e das
Atribuições
Art.1º - Protesto
é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento
de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
Art.2º - Os
serviços concernentes ao protesto, garantidores da autenticidade,
publicidade,segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime
estabelecido nesta Lei.
Art.3º - Compete
privativamente ao Tabelião de Protesto de Títulos, na tutela dos
interesses públicos e privados, a protocolização, a intimação, o
acolhimento da devolução ou do aceite, o recebimento do pagamento, do título e
de outros documentos de dívida, bem como lavrar e registrar o protesto ou
acatar a desistência do credor em relação ao mesmo, proceder às
averbações, prestar informações e fornecer certidões relativas a todos os
atos praticados, na forma desta Lei.”
- No Direito Brasileiro não existe nenhum outro modo de se provar a
impontualidade do devedor, para fins de falência, que não o protesto do título.
- Atenção: No caso de um título
de crédito, a caracterização da impontualidade ocorrerá com o simples protesto
cambial, mesmo que extemporâneo, ou seja, mesmo
que fora do prazo estabelecido pela legislação para assegurar o direito de
regresso contra o endossante.
- Atenção: Para que seja decretada a falência do co-devedor, como,
por exemplo, o endossante do título, o
protesto deverá ser realizado no prazo legal, ou seja, no prazo de 30 (trinta)
dias, contados do vencimento da obrigação. Prazo que deve ser cumprido, por se
tratar de condição de exigibilidade da
obrigação.
- Atenção: No caso do credor que resolve pedir a falência do avalista do titulo, não será possível tal
pretensão, vez que a legislação cambial
não permite o protesto comum ou cambial contra a figura do avalista.
Vedação que se infere do disposto no art. 29, III, do Decreto 2.044/1.908[5].
“Decreto
2.044/1.908
(...)
Art.29 - O
instrumento de protesto deve conter:
(...)
III - a
certidão da intimação ao sacado ou ao aceitante ou aos outros sacados, nomeados
na letra para aceitar ou pagar, a resposta dada ou a declaração da falta da
resposta. (...)”
- Atenção: Em relação ao avalista do título, se o mesmo estiver sujeito
a protesto cambial, ele será protestado
da mesma forma como se protesta um titulo executivo judicial, por meio do chamado
“protesto
especial de falência”, o qual tem o mesmo procedimento do protesto
cambial.
- Atenção:
“Lei
nº 9.492/97
(...)
Art.26 - O
cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato
de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do
documento protestado, cuja cópia ficará arquivada. (...)”
- Atenção: No caso do protesto
irregular, o mesmo não serve para instruir pedido de falência. Exemplo: Quando a certidão do protesto
não menciona o nome da pessoa que recebeu a intimação, como representante legal
do devedor ou quando a intimação ao devedor foi feita por edital e não se
registrou no instrumento a tentativa de intimação pessoal. Nestes casos ocorrerá a extinção do processo de falência, na forma do art. 267, IV,
do CPC, por carecer a matéria, desde o nascedouro, de pressupostos de
constituição válida e regular do processo.
2.5 – Síntese
a respeito do pedido de falência requerido com fundamento na impontualidade do
devedor:
1ª) Os
credores podem reunir-se em litisconsórcio a fim de perfazer o limite de 40
salários mínimos (§ 1º, do art. 94, da LRF).
2ª) Ainda
que líquidos não legitimam pedido de falência os créditos que nela não
se possam reclamar. (§ 2º, do art. 94, da LRF).
- Atenção: O art. 5º, em seus incisos I e
II, da LRF, estabelece quais obrigações não podem ser exigidas na falência.
Estas obrigações, mesmo que tenham um valor liquido, não podem fundamentar pedidos de falência.
- Atenção: O inciso I, do referido art.
5º, diz serem inexigíveis as obrigações a titulo gratuito. Isto porque doações, atos de benemerência e favores
prometidos não podem ser cobrados na falência.
- Atenção: Poderá também ser considerado
ato a título gratuito o aval prestado sem interesse econômico direto da
empresa devedora, fiança, cessão, comodato.
- Atenção: O inciso II do referido art.
5º, da LRF, diz serem inexigíveis as
despesas que os credores fizerem para tomar parte na recuperação judicial ou na
falência, salvo as custas judiciais decorrentes de litígio com o devedor.
“Art.5o - Não são exigíveis do devedor, na
recuperação judicial ou na falência:
I – as obrigações a título gratuito;
II – as despesas que os credores fizerem para
tomar parte na recuperação judicial ou na falência, salvo as custas judiciais
decorrentes de litígio com o devedor. (...)”
3ª) A
impontualidade se prova pelo protesto do título executivo (§ 3º, do art. 94, da
LRF). Assim, de acordo com este dispositivo, quando o credor houver pedido a
falência de seu devedor com fundamento na impontualidade, deve instruir seu pedido com os títulos executivos, na forma do parágrafo
único, do art. 9º, da LRF, ou seja, no original ou com cópias autenticadas se
estivem juntados a outros processos, acompanhados, em qualquer caso, dos
respectivos instrumentos de protesto para fim falimentar nos termos da
legislação específica.
“Art.9o - A habilitação de crédito realizada pelo
credor nos termos do art. 7o, § 1o, desta
Lei deverá conter:
(...)
Parágrafo
único - Os
títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original
ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo. (...)”
- Atenção: Para o Prof. Fábio Ulhoa
Coelho[6] o credor para legitimar-se ao pedido
de falência deve exibir o seu título, mesmo que não vencido, ou seja, quando
o credor exibir o seu título não vencido e também a prova da impontualidade do
devedor relativamente à obrigação de que terceiro seja titular, por meio de
certidão de protesto, o pedido de falência poderá ser ajuizado com base no art.
94, I, da LRF. Isto porque, na visão de Fábio Ulhoa Coelho, não é necessário
que o requerente da falência tenha seu título vencido, mesmo quando o pedido se
funda na impontualidade injustificada ou execução frustrada, desde que estas
tenham ocorrido em relação a outro título.
3 – Declaração
da falência em razão da inexistência de bens (execução frustrada)
“Art. 94- Será decretada a falência do devedor que:
(...)
II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita
e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal;”
3.1 – Observações
acerca da declaração da falência em razão da inexistência de bens
1ª) Na declaração da falência em
razão da inexistência de bens, não há
limite mínimo de valor e nem a necessidade de protesto.
2ª) Não é faculdade exclusiva do
credor do devedor empresário que propôs o processo de execução, ou seja, o
direito de execução coletiva universal, decorrente desse
fato processual, é de todo e qualquer credor, ainda que não vencido o seu
crédito.
3ª) A execução singular deverá ser suspensa (art.791, III, do CPC) ou o credor desiste e pede o
arquivamento da execução. Em outras palavras, o credor não pode se utilizar,
concomitantemente, dos dois instrumentos (execução singular e execução
coletiva).
“Art.791 - Suspende-se a execução:
(...)
4ª) A lei esclarece: bens
suficientes para garantia da execução.
5ª) Porque este dispositivo (o credor desiste e pede o arquivamento
da execução)? Dentre outras razões, pelo direito de preferência sobre os
bens penhorados do devedor que adquire o credor exeqüente (art.612, do
CPC).
“Art.612 - Ressalvado o caso de insolvência
do devedor, em que tem lugar o concurso universal (Art. 751, III), realiza-se a
execução no interesse do credor, que adquire, pela penhora, o direito de
preferência sobre os bens penhorados. (...)”
6ª) O pedido de falência será instruído com certidão expedida pelo juízo
em que se processa a execução (§ 4º, do art. 94, da LRF).
Referências
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, v.3.,
São Paulo: Saraiva, 2005.
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito
Comercial. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
______. Comentários à nova lei de falências e de recuperação de empresas. 5.
ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2008.
COELHO, Fabio Ulhoa. Comentários à
Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. 6.ª edição. Editora
Saraiva. 2009.
COMPARATO, Fábio Konder. Direto
empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva, 1995.
DINIZ, Fernanda Paula. A crise do
direito empresarial. Arraes Editores, Belo Horizonte, 2012.
MAMEDE, Gladston. Falência e
Recuperação de Empresas, 3ª Edição. São Paulo: Atlas S.A., 2009.
PAES DE ALMEIDA, Amador. Curso de
Falência e Recuperação de Empresa, 25ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2009.
PAIVA, Luis Fernando Valente de
(Coord). Direito Falimentar e a nova lei de Falências e Recuperação de
Empresas, SP: Quartier Latin, 2005.
PRETTO, Alessandra Doumid Borges; e
NETO, Dary Pretto. Função Social, Preservação da Empresa e Viabilidade
Econômica na Recuperação de Empresas. http://antares.ucpel.tche.br/ccjes/upload/File/artigo%20dary%20Alessandra.pdf
SCALZILLI, João Pedro; TELLECHEA,
Rodrigo; SPINELLI, Luis Felipe. Objetivos e Princípios da Lei de Falências e
Recuperação de Empresas. http://www.sintese.com/doutrina_integra.asp?id=1229
[1] COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito
comercial, v.3/ COELHO, Fabio Ulhoa: direito de empresa – 7a. ed. atual. – São
Paulo.Saraiva, 2.007, p.251
[2] BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova
Lei de Recuperação e Falências comentada. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 3a. ed. 2005, p. 235/236
[3] COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito
comercial, v.3/ COELHO, Fabio Ulhoa: direito de empresa – 7a. ed. atual. – São
Paulo.Saraiva, 2.007, p.252.
[4] Lei que define competência,
regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos
de dívida e dá outras providências.
[5] Decreto que define a letra de
câmbio e a nota promissória e regula as Operações Cambiais.
[6] Manual de Direito Comercial, 16. ed.,
2005, p. 322, Saraiva
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